Houve censura e retrocesso em decisão para retirar reportagens, diz Marco Aurélio

Para ministro do Supremo Tribunal Federal, determinação de Alexandre de Moraes para excluir matéria da revista Crusoé do ar marca 'retrocesso em termos democráticos'

Marco Aurélio Mello. Foto: Carlos Moura/SCO/STF

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse nesta quarta-feira ao Estadão/Broadcast Político que houve censura na decisão do colega Alexandre de Moraes de determinar à revista digital “Crusoé” e ao site “O Antagonista” a remoção da reportagem “O amigo do amigo do meu pai”, que menciona o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli. Para Marco Aurélio, o episódio marca um “retrocesso em termos democráticos”.

“Isso, pra mim, é inconcebível (a remoção do conteúdo dos sites jornalísticos). Prevalece a liberdade de expressão, para mim é censura”, disse Marco Aurélio à reportagem.

O site informou que a reportagem tem como base um documento que consta dos autos da Operação Lava Jato. O empresário Marcelo Odebrecht encaminhou à Polícia Federal informações sobre codinomes citados em e-mails apreendidos em seu computador em que afirma que o apelido “amigo do amigo do meu pai” se refere a Toffoli.

“Eu não vi nada de mais no que foi publicado com base em uma delação. O homem público é, acima de tudo, um livro aberto. (A remoção de conteúdo) É um retrocesso em termos democráticos”, avaliou Marco Aurélio Mello.

A decisão de Alexandre de Moraes de remover conteúdo de “Crusoé” e “O Antagonista” foi reprovada pela cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR). Pelo menos três ministros do STF também criticaram reservadamente a decisão do ministro por avaliar que o entendimento de Moraes contraria entendimentos recentes do tribunal sobre a liberdade de imprensa e abre margem para excessos.

Indagado se o plenário do Supremo poderia derrubar a decisão de Moraes, Marco Aurélio disse: “Não sei, cada qual tem a sua concepção sobre o Estado democrático de direito. A minha é sólida e sempre procedi assim.”

ARQUIVAMENTO

Nesta terça-feira, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, informou ao STF que deve ser arquivado o inquérito aberto pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, para apurar ameaças e fake news contra a instituição e seus integrantes.

A manifestação foi encaminhada ao relator do inquérito, Alexandre de Moraes, nesta terça-feira, data em que foi deflagrada uma operação para vasculhar residências de pessoas que criticaram o Supremo nas redes sociais, e um dia após a notícia de que o ministro mandou retirar do ar reportagens dos sites da revista “Crusoé” e “O Antagonista”.

“O STF não pode a um só tempo instaurar o inquérito, investigar e julgar. Não pode. Isso quebra a organicidade do direito. O STF é o Estado julgador, não o acusador. O Estado acusador cabe ao Ministério Público. Tempos estranhos!”, comentou Marco Aurélio à reportagem.

Procurado pela reportagem, o gabinete de Alexandre de Moraes não havia se manifestado até a publicação deste texto.

Informações do Jornal O Estado de São Paulo/Estadão