É na região do Planalto Central que estão os melhores cafés e cachaças produzidos no Brasil. Pelo menos é o que apontam os resultados de dois prêmios respeitados no país: Ernesto Illy (2019) e CNA Brasil Artesanal (2022). Os títulos podem até surpreender, mas revelam uma nova característica do Distrito Federal: a força da produção rural.
A altitude do quadradinho, principalmente na região Norte (composta por Fercal, Planaltina, Arapoanga, Sobradinho e Sobradinho II) que é caracterizada por ser uma área serrana, e o clima seco são dois fatores essenciais para o sucesso da cafeicultura, do terroir da cachaça e de tantas outras culturas que vêm crescendo no Distrito Federal, a exemplo do morango e da goiaba.
Em 1988 quando o paraibano Carlos Coutinho comprou um pedaço de terra no Lago Oeste, ele não imaginava que o local, que batizou de Fazenda Novo Horizonte, se tornaria num grande e importante cafezal do DF. Hoje, o espaço abriga o Café Minelis, um dos mais elogiados do país pela qualidade do grão, com os títulos de campeão nacional em 2019 e campeão regional do Centro-Oeste em 2013, 2014, 2019 e 2021 no Prêmio Ernesto Illy, além de campeão nacional do Prêmio Olam Coffee de Cafés Especiais 2021.
“A minha ideia era ter isso aqui como terapia ocupacional. Como tinha ascendência rural, criei inicialmente gado de corte, depois migrei para o gado de leite. Resolvi mudar e comecei a estudar alguma coisa que pudesse ser permanente, dado que estamos ao lado do Parque Nacional de Brasília e numa região montanhosa de solos difíceis. Até imaginei o café, mas era uma cultura muito complicada e eu não tinha essa experiência”, lembra.
Foi então que, em 2002, Coutinho ganhou um caminhão de mudas de café de um amigo, comprou um livro sobre o plantio e começou a plantar. A empreitada deu certo e o tornou um dos produtores de café mais famosos do Brasil. “Só depois que comecei a plantar que percebi que nós estamos em um dos melhores lugares em termos de clima, por causa do inverno seco. O café quando chega num estágio de maturação, se ele pega chuva por muitos dias, ele fermenta. Aqui nós não temos chuva desde maio e isso para o café é uma maravilha. Permite que a gente faça café melhores”, define.
A localização da fazenda também é outro ponto positivo para a produção da espécie de café escolhida por Coutinho. “Os cafés arábicas são plantados de modo geral em altitudes maiores, acima de 80 metros, e os café especiais sempre estão acima de mil metros. Brasília está a mil metros do Lago Paranoá e nós estamos aqui [no Lago Oeste] numa altitude que varia de 1.150 a 1,2 mil metros, o que é muito bom para o café”, acrescenta.
Apesar das boas características da cidade, a produção do café no DF ainda surpreende. “Quando vamos para os prêmios sempre é uma surpresa grande. Esse café é de Brasília? E Brasília produz café? As pessoas questionam. É bem verdade que ainda temos poucos produtores. Mas já temos vários produtores premiados aqui. Só na premiação da Illy a nossa região já tem três e isso é muito importante. O café é uma cultura que viabiliza a pequena propriedade. É uma excelente alternativa no ponto de vista de renda”, afirma.
Segundo dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-DF), até o ano passado o DF tinha 83 agricultores de café com 418,002 hectares de área de cultivo e uma produção de 1.204,92 toneladas. Existe uma intenção do setor em criar uma rota da cafeicultura em Brasília.
O Café Minelis é um dos pioneiros no turismo do café. A propriedade promove duas vezes por mês o Minelis Coffee Experience, um evento de visitação à Fazenda Novo Horizonte em que os participantes acompanham a jornada do café especial, da semente à xícara. A visita pode ser comprada pelo site oficial. Já o café pode ser apreciado na Cafeteria Minelis, no Bosque Park Norte, no Setor Hospitalar Norte.
Nova tradição
Outro produto produzido no DF que é a cara do Brasil e vem ganhando cada vez mais reconhecimento na capital é a cachaça. Em 2021, quatro “marvadas” daqui foram premiadas ficando entre melhores do país, de acordo com o V Ranking Cúpula da Cachaça. Principalmente porque as condições climáticas do cerrado são favoráveis para o cultivo de cana-de-açúcar.
“Para a cana, quanto mais seco o tempo, mais açúcar é produzido. Quando está chovendo, não produzimos cachaça”, conta o produtor da cachaça Remedin, Cid Faria, que produz a matéria-prima em uma fazenda na Fercal, onde também tem o alambique para a criação da bebida. “Essa região tem uma topografia muito próxima de Minas [Gerais], com calcário e serra, o que é absolutamente agricultável e que dá supercerto para a cana, o que a gente chama de terroir. Foi uma surpresa para mim”, completa.
No ano passado, a Remedin conquistou o prêmio de melhor cachaça branca artesanal do Brasil. No ano anterior, a bebida foi medalha de prata na Expocachaça. “A Remedin devagarinho está seguindo seu caminho e acreditamos que vamos ter bons frutos pela frente. O brasiliense pode encher o peito e dizer que o DF produz a melhor cachaça branca do Brasil”, afirma Cid Faria.
A família entrou para a produção de cachaça por acaso. Mineiro, ele sempre gostou de uma “cachacinha” e após tentar trabalhar com peixe e gado sem sucesso no terreno vislumbrou a possibilidade de transformar o hobby em negócio. “Começamos do zero. A gente não tinha tradição familiar, não conhecia ninguém que produzia cachaça. Mas com muita pesquisa e suor, corremos atrás de tudo para fazer a coisa absolutamente legalizada, com registro no Mapa. Foi a tradição mineira falando mais forte aqui em Brasília”, conta.
Pela cultura da produção de cachaça ainda estar dando os primeiros passos no DF, os produtores ainda encontram dificuldade. “Com isso, você tem poucos produtores, mas esses poucos nos receberam de braços abertos e nos ajudaram demais. Se você tem uma marca fazendo sucesso aqui e outra ali, vai potencializar o mercado”, analisa Faria. A Remedin hoje é comercializada pelo site oficial.
Fonte: Agência Brasília