Fruto de pedido da comunidade: o CED Darcy Ribeiro do Paranoá

Diferentemente de muitos colégios públicos, mesmo alguns com bons resultados, o Centro Educacional (CED) Darcy Ribeiro, no Paranoá, se destaca, logo de cara, pelo muro bem pintado, sem marcas da ação no tempo. O interior e o exterior do colégio, fundado em 1997, estão nos trinques. Além de a equipe tomar providências assim que percebe qualquer avaria, os próprios estudantes não admitem estragos. Quando o muro da escola amanheceu pichado, fizeram mutirão para limpar.

“A gente faz questão de fazer a manutenção todo fim de ano, usando recursos do Pdaf (Programa de Descentralização Administrativa e Financeira). A ideia é manter o mais arrumado possível, não deixar a escola ter pequenos problemas”, afirma o vice-diretor Francisco Augusto Vasconcelos Silva. “Se uma torneira quebra, a gente vai atrás de arrumar na hora. Quanto mais bonita a escola, mais os alunos conservam”, percebe.

No cargo desde 2013, ele começou a trabalhar no local em 2003, como professor de educação física. Desde essa época, nota como o centro educacional é valorizado pelos moradores. “A escola é fruto de orçamento participativo. Isso tem muito significado, pois a comunidade quis a escola. Somos muito bem-vistos, existe respeito pelo professor. As pessoas querem colocar os filhos aqui, os alunos também veem o local como referência”, comenta.

O próprio Francisco conta que se apaixonou pelo colégio quando foi trabalhar ali. “Aqui sempre foi muito organizado. Tem escolas onde a gente vê aluno querendo sair, pular o muro para ir embora. Sempre me impressionou o fato de aqui ser o contrário: se a gente deixar a escola aberta depois que termina a aula, o pessoal não vai embora”, diz. Desde que ingressou na instituição, Francisco viu muitas melhorias, como a criação de laboratórios, instalação de projetor e TV nas salas, e até a aquisição de lousa digital.

Criar uma comunidade tão unida e engajada num universo de 1,3 mil alunos, dos quais 900 são de ensino médio, não é tarefa fácil. Francisco acredita que fazem diferença o empenho dos professores e a existência de projetos com os quais os alunos se identifiquem, o que ajuda a superar os vários obstáculos presentes na região. “Até o formato da escola, que é em ‘u’, facilita. Todo mundo está se vendo sempre”, brinca.

“Sem desmerecer as outras escolas, mas é a melhor do Paranoá”, diz o aluno do 1º ano Fabrício dos Santos Texeira de Souza, 15 anos, sobre o porquê de ter ido estudar ali. “Aqui é o lugar onde eu me sinto mais vivo. A escola é um ambiente em que você realmente quer estar. É um lugar bacana e bem cuidado.” Filho de um agricultor e de uma faxineira, Fabrício tem o potencial de ser o primeiro da família a cursar ensino superior. Por isso, tem se dedicado aos estudos e se destacado com boas notas.

Cursando o 3º ano do ensino médio, Ana Beatriz Rodrigues, 17 anos, é grata aos professores. “Eles são muito bons e empenhados em desenvolver atividades.” Ela cita como projeto positivo o Ler e Escrever, em que os alunos redigem textos sobre temas variados. “Os temas costumam ser mais voltados ao social. Antes de escrever, vemos vídeos, lemos outros textos”, conta.

“Os simulados também nos ajudam bastante para, quando chegar o dia de provas como o PAS (Programa de Avaliação Seriada da Universidade de Brasília) e o Enem (Exame nacional do Ensino Médio), a gente não ficar tão nervosa”, comenta. Com relação à estrutura física, Ana Beatriz só viu avanços. “Desde que cheguei, no 1º ano, trocaram as carteiras, reformaram os banheiros. A equipe se empenha muito para ser um lugar agradável de a gente estar”, comenta ela, que deseja cursar farmácia na UnB.

Reunião dos representantes de classe

O apego com o colégio existe tanto por parte dos alunos quanto dos pais. “Nas reuniões e nos projetos de culminância, a taxa de participação das famílias é de 70%. Os responsáveis cobram e questionam a escola, o que é muito bom”, avalia o vice-diretor Francisco. Em três turnos, os 90 funcionários, dos quais 55 são professores, atendem alunos do 5º ano do ensino fundamental ao 3º ano ensino médio. Na avaliação do vice-diretor, esse é um ponto positivo para ter bons resultados no Enem.

Em 2018, o CED Dary Ribeiro foi a escola pública da Coordenação Regional de Ensino do Paranoá com melhor desempenho na prova. “Tem muitos alunos que percorrem os dois ciclos aqui. Isso facilita, pois eles não têm dificuldades quando chegam ao ensino médio”, aponta o vice-diretor. Fundamental é também o empenho dos mestres. “Dentro da Secretaria de Educação, somos conhecidos como uma escola em que os professores trabalham muito. Tem inclusive professor de contrato temporário que não quer vir para cá por isso”, comenta.

O projeto pedagógico orienta todo o trabalho ali dentro. “Aqui, a coordenação funciona do jeito que tem que funcionar e desenvolvemos, ao longo do ano, tudo que foi combinado.” E não só o acertado, como muito mais. Professor de matemática, Vinicius Elias, 33 anos, já nem trabalha mais ali, mas não sai do CED Darcy Ribeiro. Aos sábados, atua como voluntário, organizando um cursinho comunitário com foco no Enem e no PAS.

“Começou há quatro anos por demanda dos alunos, pois não havia nenhum cursinho aqui. Começamos fazendo aulões e, no ano seguinte, abrimos para a comunidade externa”, detalha ele, que mora no Paranoá. Assim, aos sábados, o local fica cheio de estudantes — e não só dos que estudam no CED Darcy Ribeiro. A turma pré-Enem tem 50 alunos presenciais e uma sala virtual com mais de 1 mil integrantes das mais diversas regiões do país.

As turmas pré-PAS têm média de 35 estudantes presenciais cada. Nas aulas com foco no Programa de Avaliação Seriada, o trabalho é feito em cima das obras cobradas em cada etapa. “É bonito ver o quanto os alunos estão interessados. A primeira turma é às 8h da manhã. Faça chuva ou faça sol, eles vêm. A última turma começa às 11h e vai até as 14h, eles ficam sem almoçar e ninguém falta”, comenta Vinicius.

Graças a iniciativas como o cursinho e o empenho de professores, o número de alunos do CED Darcy Ribeiro aprovados em universidades cresce a cada ano. Ywanne de Sousa Silva, 18 anos, está no 2º ano e aproveita o projeto. “Quero fazer biologia na UnB, e o Vinicius tem me ajudado bastante com isso. Ele abre a mente das pessoas e nos incentiva”, elogia. Ela percebe o mesmo esforço nos professores regulares do colégio.

“Não importa o horário ou a aula, eles nunca deixam o aluno sem auxílio. Os profissionais do SOE (Serviço de Orientação Educacional) e da direção também incentivam. Só o fato de eles se preocuparem com a gente já é importante”, afirma. Segundo Ywanne, o clima da escola é muito bom: casos isolados de violência ou bullying são logo barrados pela diretora, Aldeneide Conceição dos Santos Rocha. “Ela é muito rígida quanto a isso e não permite. A inclusão e o respeito são trabalhados até nas nossas redações, sobre temas como negros e pessoas com deficiência.”

O colega Fellipe Dias, 16 anos, concorda. “Eu vim para cá ano passado transferido de uma escola, onde eu me sentia meio excluído e deslocado”, relata ele, que está no 2º ano. No CED Darcy Ribeiro, não teve dificuldade de se adaptar. “Eu estou achando fenomenal estudar aqui. O aluno se sente à vontade para se descobrir e ser ele mesmo. A escola é bem tolerante, todos têm liberdade para se expressar.”

É bem diferente da experiência que ele teve no ensino fundamental. “Lá tinha muitas piadinhas, bullying, combinado com racismo e homofobia”. O adolescente deseja estudar administração e vê como grande ponto positivo do colégio diálogos e debates em sala de aula: “As reflexões que os professores trazem sobre o nosso cotidiano nos fazem sentir representados”.

O professor Nicholas Castro (camisa vinho) com turma

É justamente em debates que o professor de sociologia Nicholas Castro, 31 anos, gosta de basear suas aulas. “Existe a exposição tradicional, e muitos educadores ficam presos a isso. Mas, para o aluno formar senso crítico, a gente precisa debater”, explica. “Preparo minhas aulas não só para passar o conteúdo, mas para incentivar e mediar o debate. Os estudantes não aprendem só com professor, eles aprendem uns com os outros também.”

Segundo Nicholas, isso ajuda os jovens a formular ideias próprias, algo importante para o bom resultado em provas como o Enem. Também faz diferença o estímulo de todo o colégio para que os adolescentes se inscrevam em seleções. Afinal, num contexto em que muitos dos pais não chegaram ao ensino superior e não têm informação sobre o acesso a universidades, a escola ganha a missão de fazer isso.

“Os alunos precisam se inscrever, estar motivados e se prepararem. Quando não tem esse incentivo dentro de casa, é papel da escola puxar esse papel para si. É o que o CED Darcy Ribeiro faz.” Com estímulo, Nicholas avalia que o corpo estudantil acaba adquirindo um perfil muito dedicado e pronto para avaliações como Enem e PAS e para a vida adulta.

  • Cursinho comunitário pré-Enem e pré-PAS aos sábados: aberto para alunos da escola e outros interessados da comunidade
  • Simulado multidisciplinar bimestral: professores de todas as disciplinas contribuem com questões de prova. O teste trabalha a contextualização e ajuda a preparar para avaliações como o PAS e o Enem.
  • Semana Cultural e Científica: os professores atuam como orientadores para os alunos elaborarem trabalhos;
  • Festival da Paz: gincana de atividades solidárias, cognitivas, afetivas e lúdicas;
  • Jogos escolares: competição esportiva;
  • Projeto Ler e Escrever: aplicado na parte de conteúdo diversificado, fora das aulas de português. Os encontros desenvolvem a leitura e a escrita a partir de temas da atualidade;
  • Google Class: comunidade virtual de pais, por meio da qual a escola dá avisos, divulga calendários e programações;
  • Concursos de redação: incentivo à participação dos alunos, e há estudantes premiados;
  • Olimpíadas: a participação mais efetiva é na Obmep (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas), em que alunos do CED Darcy Ribeiro foram premiados.

Informações do Jornal Correio Braziliense