Todo policial ao ingressar nas respectivas corporações é investido de poder, autoridade e legitimidade para atuar. Basta a ele conquistar a confiança da comunidade e potencializar tudo isso, afinal, o que dá legitimidade as ações policiais é o tripé: legitimidade, poder e confiança. A autoridade é resultado de tudo isso. Quando se perde a legitimidade, perde-se também a confiança, o poder e a autoridade. No final, perdeu o emprego.
De acordo com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, durante uma abordagem, quatro policiais militares foram acusados de terem cometido crime de tortura, em Itajaí, Santa Catarina, em 2011. Agora, a Vara Militar da Capital condenou-os à perda do cargo público, além de penas de reclusão e detenção. A sentença é do juiz João Batista da Cunha Ocampo Moré e foi publicada nesta terça-feira (14/7). Algo que todo policial precisa ficar atento e com isso, aprender com os erros alheios.
De acordo com os autos, os acusados entraram em uma residência para apurar uma denúncia de tráfico de drogas. No imóvel, localizaram um revólver e certa quantia de maconha. A denúncia do Ministério Público, no entanto, destaca que os PMs passaram a constranger dois homens e uma mulher com emprego de violência física na tentativa de localizar mais drogas.
Os dois homens teriam sido agredidos com diversos disparos de pistola Taser. Um deles, inclusive, teve a cabeça batida contra a parede. A denúncia narra, ainda, que a mulher foi sufocada com um saco plástico por diversas vezes, chegando a desmaiar. Tal fato nos remete as famosas cenas do Filme Tropa de Elite.
Além dos depoimentos dos envolvidos, que o juiz considerou claros e coerentes, relatório obtido pela análise da pistola Taser usada na abordagem demonstrou que foram realizados 33 disparos na data dos fatos. Todos os acusados, conforme a sentença, incorreram no crime de tortura – um deles na modalidade omissiva, pois não participou das agressões, mas o tinha o dever de evitá-las, fato muita das vezes não observado. Muitas vezes, pensa-se somente na ação e se esquecem da omissão.
“Não se pode deixar de esclarecer que a eventual ligação das vítimas ao tráfico de drogas ou dedicação a atividades criminosas não é objeto da presente Ação Penal, e de forma nenhuma legitima o evidente excesso e crueldade das agressões perpetradas a pretexto de um bem maior, qual seja, a segurança pública,” disse o juiz.
Dois policiais foram condenados a 10 anos, 2 meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial fechado, com o agravante de que as agressões ocorreram durante abordagem policial e com emprego de arma, material ou instrumento de serviço.
Um terceiro policial foi sentenciado a 10 anos, 10 meses e 18 dias, também em regime inicial fechado, pelas mesmas circunstâncias e mais o agravante de ordenar as ações dos demais.
O quarto policial envolvido na ocorrência recebeu pena de 3 anos de detenção, em regime inicial semiaberto, considerando o cometimento do crime na modalidade omissiva. Mas foi determinada a perda do cargo aos quatro réus. Eles terão o direito de recorrer em liberdade, mas terão vários desgastes e gastos.
Existe uma linha tênue entre o herói e o vilão fardado no Estado Democrático de Direito. Sabendo disso, o tripé: legitimidade, autoridade e confiança precisa ser respeitado, pois somente assim, o “poder” será preservado e com ele os respectivos empregos.
Lei da Tortura
A Lei 9.455 de 1997, mais conhecida como Lei da Tortura versa:
”Art. 1º Constitui crime de tortura:
I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
[…]
§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
I – se o crime é cometido por agente público;
[…]
§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.”
*Por Aderivaldo Cardoso – Com informações do TJSC