A proposta do plano de carreira e a mais nova tentativa de privilegiar os subtenentes

A proposta do plano de carreira e a mais nova tentativa de privilegiar os subtenentes em detrimento das demais praças na inclusão ao quadro QOPMA.

Texto de Rodrigo Pretel – 1º Sargento QPPMC
Eis que às vésperas do processo de escolha dos novos representantes parlamentares, surge a história do tão sonhado plano de carreira ideal, onde tanto os novos integrantes, quanto os policiais antigos teriam seus direitos de ascensão assegurados, tal como ocorrem em várias outras categorias de servidores públicos, independente de ingerências ou vontades políticas.
Até aí tudo bem, visto que qualquer categoria profissional deve sempre buscar o melhor a seus integrantes, de maneira que possa prestar, por consequência, um melhor serviço à sociedade que serve. Entretanto, após ter acesso ao documento protocolado na Casa Militar em 14 de maio de 2018, por meio de um blog relacionado a assuntos da PMDF, é possível notar sua verdadeira intenção, que é tão somente de tolher direitos conquistados pelos integrantes da carreira das praças da Polícia Militar, privilegiando tão somente a graduação de subtenente para possibilidade de acesso ao quadro de Oficiais Administrativos.

A minuta de medida provisória encaminhada a Casa Militar do Distrito Federal, propõe que a seleção dos praças que poderão compor o quadro de oficiais QOPMA sejam selecionados apenas entre os subtenentes. Destes 50% seriam indicados por serem os mais antigos do quadro, e os outros 50% selecionados através da aprovação em processo seletivo de provas.

Sem tecer qualquer comentário sobre o teor do restante do documento, ou sobre as possíveis intenções eleitoreiras ao apresentar a referida proposta neste ano, vivemos um momento ímpar na Polícia Militar do Distrito Federal, pois está sendo finalizado o processo da primeira seleção que irá compor o Quadro de Oficiais Administrativos, segundo as normas estabelecidas na Lei nº 12.086/2009.
Trata-se da primeira, porque desde sua entrada em vigor, alguns critérios foram sobrestados por 60 meses, para que a corporação e seus integrantes pudessem se adequar às novas exigências. Sendo assim, por cinco anos o acesso se deu tão somente pela indicação dos mais antigos de cada quadro, que no caso são os subtenentes. Após este período, 2014, deveria ser realizado a seleção dos policiais que iriam compor o quadro administrativo somente por mérito intelectual, que é totalmente coerente com as conquistas obtidas pela Polícia Militar na área de educação e ensino ao longo dos anos,  visto que a função de Oficial Administrativo exige conhecimentos técnicos e específicos que o candidato deve possuir, para exercer um serviço de excelência.
Foi então que começaram as tentativas de mudança da lei, para que mantivessem a oportunidade desta ascenção profissional somente para os mais antigos, com diversas desculpas, dentre elas, a de que a carreira teria mais fluidez, que mais policiais seriam “agraciados”.
Finalmente no ano de 2017, foi sancionada a Lei n° 13.459/2017, alterando dispositivo da Lei nº 12.086/2009, onde ficou estabelecido novo critério para ingresso no quadro QOPMA. Critério conhecido como 50/50.

A redação do artigo 32 passou a vigorar da seguinte forma:
Art. 32. ……………………………………………………………………….

I – ser selecionado dentro do somatório das vagas disponíveis no respectivo Quadro ou Especialidade para matrícula no Curso de Habilitação de Oficiais Administrativos, Especialistas e Músicos (CHOAEM), sendo:

  1. a) 50% (cinquenta por cento) das vagas ocupadas pelo critério de antiguidade; e
  2. b) 50% (cinquenta por cento) das vagas ocupadas mediante aprovação em processo seletivo de provas, de caráter classificatório e eliminatório, destinado a aferir o mérito intelectual dos candidatos;
E como critérios objetivos não alterados pela nova lei, permaneceram os seguintes requisitos para investidura no cargo:
Art. 32. ……………………………………………………………………….
II – possuir diploma de ensino superior expedido por instituição reconhecida pelo Ministério da Educação, observada a área de atuação;
III – possuir, no mínimo, 18 (dezoito) anos de serviço policial militar, até a data da inscrição do processo seletivo;
VI – pertencer ao QPPMC para o acesso ao QOPMA;
Art. 33.  A Praça a que se refere o art. 32 frequentará o Curso de Habilitação de Oficiais na graduação em que se encontra ou na que venha a ser promovida no decorrer do curso.
Parágrafo único.  Se o candidato não concluir com aproveitamento o curso de que trata o caput, permanecerá na graduação e voltará a ocupar a mesma posição anterior na escala hierárquica.

Na exposição de motivos  (EM nº 00369/2016) encaminhados ao Presidente da República em 20 de dezembro de 2016, resultando na MP n° 760/16 e posteriormente na Lei n° 13.459/2017, foram alegados que as medidas propostas para a reestruturação das carreiras foram resultados de amplos debates desde o ano de 2014, pela Comissão de Reestruturação constituída pelo Governo do Distrito Federal e entidades, tais como ASOF,  ASPRA, ASSOF, ASBOM e Clube dos Bombeiros Militares do DF.
Propôs então a alteração de dispositivos da Lei nº 12.086/2009, de forma a incluir a antiguidade entre os critérios de seleção de praças que concorrerão às vagas disponíveis no QOPMA, e conforme as próprias palavras da exposição de motivos apresentada, justifica que “a antiguidade privilegia os militares veteranos, que prestaram bons serviços por longos períodos, mas que já alcançaram a última graduação dos quadros de praças e não possuem mais perspectivas de progressão funcional”.

Nota-se portanto que o critério de antiguidade apresentada, não visa o melhor para a coletividade, mas sim para o indivídio. E a exposição conclui que “critério de seleção por mérito intelectual é igualmente motivador, na medida em que incentiva os militares a buscarem o aprimoramento contínuo de suas competências e que confere um caráter democrático ao processo.”

Diante da Legislação em vigor, em 18 de agosto de 2017 foi publicado Edital de n° 49/DGP, destinado a selecionar no âmbito da Corporação, candidatos para  a matrícula no Curso de Habilitação de Oficiais Administrativos, Especialistas e Músicos (CHOAEM).
Após a realização das provas e divulgação dos resultados, foi constatado que figuram entre os aprovados, policiais que atualmente ocupam as graduações de 3° sargento, 1° sargento e subtenentes, o que despertou o descontentamento de vários policiais, gerando inclusive representações no Tribunal de Contas do Distrito Federal, solicitando aumento de vagas, como também  ações judiciais pedindo matrícula no curso, mesmo sem o policial ter despontado como merecedor no mérito intelectual, ou ser praça mais antigo para ser agraciado dentro do número disponível de vagas.

A presente tentativa de reformular pela terceira vez o artigo 32 da Lei 12.086/09, baseia-se na pretensa “urgência” em corrigir distorções na Carreira Policial Militar. Agora, resta saber quais distorções, visto que o maior argumento levantado por vários descontentes, é de que o atual processo é injusto, pois possibilita um 3°sargento ser oficial antes do subtenente. Alegam que não existirá mais a previsão “legal” da quebra de hierarquia, pilar base da Corporação, que garantirá em dado momento da carreira que todos possam concorrer em igualdade de condições.

Nem de longe tal argumento se sustenta, visto que na mudança da lei a exposição de motivos afirmou terem sido realizados intensos debates nos anos de 2014,2015 e 2016,e ainda, realizando uma interpretação sistêmica das leis que se aplicam à Polícia Militar do Distrito Federal, e até mesmo das que já foram aplicadas, demonstram que de modo algum há quebra da hierarquia.

A começar pelo Estatuto dos Policiais Militares,  Lei n° 7289/84, que diz em seu artigo 20:
Art 20 – O ingresso na carreira de Oficial será por promoção do Aspirante-a-Oficial PM para o Quadro de Oficiais Policiais-Militares e, mediante concurso entre diplomados por faculdades civis reconhecidas pelo Governo Federal, para o Quadro de Oficiais Policiais-Militares de Saúde.
Parágrafo único – Para os demais quadros previstos na Organização Básica da Polícia Militar do Distrito Federal, o ingresso na carreira de Oficial será regulado por legislação específica ou peculiar.

Após leitura do artigo, nota-se que apenas para o ingresso no quadro de oficiais combatentes QOPM, o legislador usou a expressão “promoção”, e que para os demais quadros da carreira de oficial, o ingresso deve observar legislação específica ou peculiar.
O ingresso no quadro QOPMA, apesar de ser uma continuação da carreira prevista em lei às praças pertencentes ao quadro de combatentes QPPMC, não se dá por promoção, mas sim por nomeação.

A lei n° 12.086/09 especifica o que vem a ser definido como promoção:
Art. 5o  Promoção é ato administrativo e tem como finalidade básica a ascensão seletiva aos postos e graduações superiores, com base nos interstícios de cada grau hierárquico, conforme disposto no Anexo I. (grifo nosso)
Para cada graduação existente no quadro QPPMC, temos a previsão de interstício, tempo necessário na gradução para que o policial possa ser promovido, podendo ainda este tempo ser reduzido pela metade, caso existam vagas no quadro. É percebido no quadro a seguir, que não há previsão de interstício na graduação de Subtenente, visto que para esta graduação não existe mais a figura da promoção.
  1. g) Quadro de Praças Policiais Militares Combatentes – QPPMC:
GRAU HIERÁRQUICOEFETIVOINTERSTÍCIO
Subtenente PM560
Primeiro-Sargento PM2.15636 meses
Segundo-Sargento PM2.16860 meses
Terceiro-Sargento PM2.74860 meses
Cabo PM3.35460 meses
Soldado PM5.564120 meses
TOTAL16.550

Anexo I da lei 12.086/09

E quanto a questão da antiguidade, é muito clara quando diz que:

Art. 7o  Promoção por antiguidade é aquela que se baseia na precedência hierárquica de um policial militar sobre os demais de igual grau hierárquico, dentro do mesmo Quadro, Especialidade, Qualificação ou Grupamento. (grifo nosso)

O advento da Lei 12.086/09 no mundo jurídico afastou a possibilidade de um policial ser promovido em detrimento de outro que tenha precedência, deixando claro esta promoção por antiguidade se dá no mesmo quadro.
Citando ainda mais outros dois dispositivos da Lei 12.086/09, não restará qualquer dúvida quanto a argumentação aqui apresentada.

Art. 17.  O Governador do Distrito Federal editará os atos de nomeação e promoção de Oficiais.
  • 1o Os atos de nomeação para o posto inicial da Carreira e de promoção a este posto ou ao primeiro posto de Oficial Superior acarretam a expedição de carta patente, pelo Governador do Distrito Federal.
Art. 25.  As promoções aos demais graus hierárquicos dos Quadros de Oficiais e Praças serão realizadas pelo critério de antiguidade.
Parágrafo único.  A antiguidade no grau hierárquico é contada a partir da data do ato de promoção, nomeação, declaração ou na data especificada no próprio ato.

A análise realizada já se mostra suficiente para refutar qualquer argumento de quebra de hierarquia, de que um policial com 18 anos de serviço, e que não seja subtenente, não possa ser  nomeado  2° tenente QOPMA, caso obtenha sua aprovação em processo seletivo. A antiguidade não se aplica ao caso.

A justificativa de quebra legal da hierarquia pode ser imputado ao próprio documento apresentado na Casa Militar, uma vez que propõe a permanência do processo seletivo para 50% das vagas entre os subtenentes. Então vejamos, é perfeitamente possível que o subtenente mais moderno logre êxito no processo seletivo, e dentro deste pequeno universo, um mais antigo que não esteja contemplado pelo outro critério fique de fora. O fato da proposta restringir a somente uma graduação a concorrência,não tem o condão de impedir o que tenta justificar mais uma mudança. Logo, o documento é contraditório.

Se trouxermos à tona o Decreto 88.777/83, que até pouco tempo fora aplicado na corporação, percebemos que era possível, inclusive, ser graduado Cabo ou 3° sargento por meio de processo seletivo.

Art . 14 – O acesso na escala hierárquica, tanto de oficiais como de praças, será gradual e sucessivo, por promoção, de acordo com a legislação peculiar de cada Unidade da Federação, exigidos dentre outros, os seguintes requisitos básicos:
1) para todos os postos e graduações, exceto 3º Sgt e Cabo PM

E para preenchimento das vagas do quadro QOPMA, podemos constatar que o critério sempre se deu exclusivamente por mérito intelectual:

Art . 15 – Para ingresso nos quadros de Oficiais de Administração ou de Oficiais Especialistas, concorrerão os Subtenentes e 1º Sargentos, atendidos os seguintes requisitos básicos:
1) possuir o Ensino de 2º Grau completo ou equivalente;
2) possuir o Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos.

Outros argumentos eventualmente surgem, tais como: o policial com menos tempo de corporação irá ocupar o posto por mais tempo, impedindo outros de ascenderem profissionalmente; ou que se está desacreditando a capacidade dos que elaboraram a proposta.

O Estatuto difere claramente tempo de serviço e anos de serviço. Logo, policiais que ingressaram na mesma data, não necessariamente irão para Reserva também na mesma data. Temos os tempos de serviço fora da corporação que são computados, Forças Armadas, licenças não gozadas, idade limite, etc.

A produção deste documento não tira o crédito da capacidade de nenhum dos envolvidos na proposta, nem esmiuça seu inteiro teor, mas tão somente tem a intenção de contrapor o ponto específico das exigências impostas àqueles que irão concorrer a nomeação do quadro QOPMA, que ao tentar se restringir, tira o caratér do interesse público em selecionar os mais capacitados, e torna-se apenas instrumento de privilégio
Por: 1° Sargento Pretel, em 21 de maio de 2018.