O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) identificaram oito regiões no Nordeste do Brasil que somavam mais de 200 mil habitantes e não possuíam nenhum leito de unidade de terapia intensiva (UTI) em dezembro de 2019. Os dados incluem as redes pública e privada e foram divulgados hoje (7) pelo instituto.
IBGE e Fiocruz usaram como base do levantamento o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde 2019 (DataSUS), que não inclui novas compras de equipamentos, como respiradores, que possam ter sido efetuadas neste ano e no contexto da pandemia.
Os dados do DataSUS foram cruzados com as regiões agrupadas pelo IBGE a partir dos deslocamentos de moradores em busca de serviços de saúde de média e baixa complexidade, o que pode, inclusive, englobar cidades de diferentes unidades da federação. Com a colaboração do MonitoraCovid-19, da Fiocruz, o IBGE constatou que as oito regiões que não possuíam UTIs em dezembro de 2019 tinham como centro os municípios cearenses de Canindé, Itapipoca, Limoeiro do Norte e Russas, além das cidades baianas de Senhor do Bonfim e Valença, e os municípios de Vitória de Santo Antão, em Pernambuco, e Itabaiana, em Sergipe.
Os leitos de UTI são necessários para a internação de pacientes em estado grave com covid-19, doença que avança no país com tendência de interiorização, segundo nota técnica publicada nesta semana pela Fiocruz. Algumas dessas cidades sem UTI aparecem também na lista das que têm menos de quatro respiradores para cada 100 mil habitantes. É o caso das regiões cearenses de Canindé, Russas, Itapipoca e Limoeiro do Norte, e das cidades de Valença (BA) e Itabaiana (SE). Também estão nessa situação as regiões de Bacabal, Chapadinha e Pinheiro, no Maranhão, Arcoverde, em Pernambuco, e Picos, no Piauí, cuja região engloba cidades no Ceará e Piauí. Em Bacabal, há apenas 1,62 respirador para cada 100 mil habitantes.
O levantamento aponta ainda grandes desigualdades quando analisadas as regiões mais populosas e as unidades da federação. A região de Manaus, por exemplo, em dezembro de 2019 tinha 9,6 leitos de UTI e 27 respiradores para cada 100 mil habitantes, enquanto a de Recife tinha a proporção de 29,5 leitos e 51 respiradores por 100 mil pessoas, os números mais elevados do país.
Entre as unidades da federação, a diferença na oferta de UTIs é ainda maior. A cada 100 mil habitantes, Roraima tem quatro leitos, Amapá e Acre têm cinco, e Amazonas e Piauí, sete. Na outra ponta da tabela, O Distrito Federal tem 30; o Rio de Janeiro, 25; e o Espírito Santo, 20.
Distrito Federal e Rio de Janeiro tinham também, em dezembro de 2019, as maiores quantidades de respiradores por 100 mil habitantes, com 63 e 42, respectivamente. No Amapá, essa proporção cai para 10 respiradores por 100 mil pessoas, enquanto Piauí e Maranhão tinham 14.
O gerente de geografia do IBGE, Cayo Oliveira Franco, avalia que os dados confirmam fragilidades no sistema de saúde de algumas regiões no Norte e Nordeste, e as informações podem subsidiar a resposta das autoridades.
“É importante que a gente tenha clareza de quais são essas regiões, pela dinâmica de interiorização do coronavírus”, disse ele, que destacou que os dados devem ser utilizados não apenas pelos prefeitos dessas cidades, mas por gestores públicos de toda a região e de esferas superiores. “É muito importante que a gente dê luz para mostrar os lugares que devem ser priorizados, obviamente observando a tendência de espraiamento do coronavírus no território”.
No caso da Região Norte, Franco ainda acrescenta que os grandes deslocamentos em direção a Manaus, muitas vezes em embarcações, são um fator que deve ser observado nesse planejamento.
“Manaus polariza uma grande quantidade de municípios, e tem uma disponibilidade não muito alta, pelo ponto de vista da população, de equipamentos e recursos humanos”, disse. “Polos regionais, como Parintins ou Tefé, poderiam servir de apoio para o estabelecimento de hospitais de campanha, para diminuir o peso sobre o sistema público de saúde de Manaus”.
Profissionais de saúde
A pesquisa também contabilizou a proporção de médicos e enfermeiros por 100 mil habitantes, parâmetro que é relevante para avaliar a capacidade de resposta do sistema de saúde. Todos os estados tinham mais de 80 médicos por 100 mil habitantes, patamar considerado mínimo para situações de normalidade.
Com 81 médicos por 100 mil pessoas, o Maranhão ficou perto desse limite. Pará (85) e Amapá (95) foram as outras unidades da federação com menos de 100 médicos por 100 mil habitantes, enquanto o Distrito Federal tinha 338, e São Paulo, 260.
Entre as 15 regiões mais populosas do país, a proporção de médicos por 100 mil habitantes ficou acima de 100, sendo a menor em São Luís, com 134, e a maior em Belo Horizonte, com 367.
Quatro regiões com mais de 200 mil habitantes ficaram abaixo da recomendação de 80 médicos por 100 mil. A pior situação foi constatada em Santarém, no Pará, com 58 profissionais. Irecê, na Bahia, Garanhuns, em Pernambuco, e Marabá, no Pará, registraram entre 60 e 65 profissionais.
Em relação à proporção de enfermeiros, o Pará tinha 76 por 100 mil habitantes, a menor do país. Todos os outros estados tinham ao menos 100 enfermeiros por 100 mil, com Distrito Federal (198), Tocantins (178) e Paraíba (149) nas primeiras posições.
Senhor do Bonfim, na Bahia, teve a pior média de enfermeiros do país entre as regiões com ao menos 200 mil habitantes, com 51 profissionais. A lista das regiões com menos de 70 enfermeiros por 100 mil habitantes inclui ainda Palmares (PE), Itabaiana (SE), Bragança (PA), Marabá (PA), Chapadinha (MA), Redenção (PA), Taquara-Parobé-Igrejinha (RS), Castanhal (PA) e Franca (SP).
População idosa
O IBGE também destacou nesta quinta-feira a distribuição da população idosa com base no Censo 2010. Pessoas com mais de 60 anos são consideradas grupo de risco no caso de infecção pelo novo coronavírus, já que há maior chance de a doença causar sintomas mais graves, internações e óbitos.
Apesar de haver dados populacionais mais recentes no nível das unidades da federação, o IBGE considera que os dados do Censo de 2010 são os mais detalhados e precisos para subsidiar o planejamento de saúde no nível municipal.
Naquele ano, o Rio Grande do Sul era o estado com o maior percentual de idosos – 13,6% de sua população tinha 60 anos ou mais. Em 12 estados, os idosos representam mais de 10% da população, e em seis deles essa parcela da população somava mais de 1 milhão de pessoas. Estado mais populoso do Brasil, São Paulo tinha 4,7 milhões de idosos em 2010.
A pesquisa também levantou a população que vive em domicílios considerados adensados, quando há mais de três pessoas para cada dormitório. O dado é relevante no contexto da pandemia, porque residências adensadas dificultam o isolamento de pessoas que apresentem sintomas, recomendação que é fundamental para a prevenção do contágio.
Em todo o país, 18,4 milhões de pessoas viviam nessas condições em 2010, o que correspondia a 9,7% dos brasileiros. Uma parte considerável dessa população estava em grandes regiões metropolitanas, como São Paulo, que tinha 2,7 milhões, e Rio de Janeiro, com quase 1,5 milhão. Nas Regiões de Manaus e Macapá, no entanto, a proporção de pessoas nessa situação chegava a quase 25%.