O Governo do Distrito Federal proibiu vendedores ambulantes de comercializar produtos em 10 zonas da região central da capital da República. Entre os espaços vetados está a Esplanada dos Ministérios, a Praça dos Três Poderes e o perímetro hospitalar das unidades de saúde pública. A medida foi publicada no Diário Oficial do DF (DODF) do último dia 18 e desagradou a categoria.
Vendedor de souvenirs há mais de 20 anos na Praça dos Três Poderes, o artesão Gil Rodrigues, 66, está descontente com a decisão. “É complicado porque nós sobrevivemos disso aqui”, disse.
Segundo ele, os vendedores que atuam na região prestam um serviço turístico aos visitantes. “Nós damos informações, convivemos com os turistas e os ajudamos. Falamos mais de uma língua para conseguir o nosso ganha pão e ainda acabamos mal vistos? É complicado. Somos todos honestos e estamos aqui, a maioria, há mais de décadas”, queixou-se o artesão.
Assim como Gil, o vendedor de picolés Judimar Ramos de Oliveira, 39, disse estar preocupado: “Se tirarem a gente daqui, não teremos outro espaço para trabalhar”. Ele conta que está no comércio informal há 15 anos.
“Sempre foi a necessidade. Eu tenho dois filhos, e o sustento da minha casa vem daqui. Moro no Vale do Amanhecer e estou aqui ganhando o meu dinheiro honestamente. A gente fica apreensivo com uma decisão dessas. Essa é uma área turística e se a gente não estiver aqui, onde os turistas poderão comprar uma lembrança ou tomar uma água?”, reclamou Judimar.
Fiscalização
O ambulante Thiago Soares da Silva, 26, comercializa salgadinhos, doces, água e refrigerantes na Esplanada dos Ministérios. De acordo com ele, foi justamente a falta de fiscalização que fez com que levasse seu carrinho improvisado para a região.
“Estou aqui nesta localidade, próximo à Catedral, tem cerca de cinco meses. Trabalho de domingo a domingo para conseguir tirar aproximadamente um salário mínimo por mês. Ajudo a minha mãe a pagar as contas e sustento o meu filho. Também estou fazendo curso de informática para sair da informalidade”, afirmou.
Thiago classifica que o comércio ambulante é uma alternativa para o desemprego. “A tendência para quem está desempregado e precisa de dinheiro é outra. Quem está trabalhando é porque quer ganhar o dinheiro, fruto do próprio esforço e suor. Já trabalhei na Rodoviária do Plano Piloto antes, mas tinha que ficar correndo como se fosse bandido e já perdi muita mercadoria”, acrescentou.
Outro ambulante, que preferiu não se identificar, lembrou que a medida contraria promessa feita à categoria pelo então candidato emedebista ao Buriti, durante a corrida eleitoral de 2018. “O hoje governador do DF veio aqui [Esplanada dos Ministérios] e disse que ninguém mexeria conosco [os ambulantes]. Agora, queremos saber se é isso mesmo. Temos o apoio dos turistas, da própria Catedral e dos frequentadores da região. Ninguém está insatisfeito com o nosso serviço. Esperamos que o GDF também cumpra o prometido”, desabafou.
De acordo com a norma, os ambulantes ficam impossibilitados de atuar nas seguintes regiões:
- Esplanada dos Ministérios;
- Eixo Monumental (entre a Rodoviária do Plano Piloto e a Praça dos Três Poderes);
- Áreas das embaixadas e representações de países estrangeiros;
- Áreas Militares e Setor Policial Sul;
- Áreas residenciais e superquadras;
- Setor Militar Urbano;
- Área Central do Plano Piloto;
- Perímetro de segurança escolar (onde não há regra oficial, abrange faixa de 100 metros de extensão a partir dos portões de acesso à escola pública ou privada);
- Perímetro hospitalar (abrange faixa de 100 metros de extensão a partir do portão de entrada);
- Pilotis e marquises de prédios públicos, residenciais ou comerciais.
Hospital de Base
Recentemente, o Metrópoles mostrou que os camelôs ocupam até mesmo o entorno de hospitais. Nas imediações do Hospital de Base (HBDF), por exemplo, são vendidos remédios naturais, ervas medicinais, acessórios para carro e celulares bem como, até mesmo, roupas íntimas femininas e masculinas.
Quem frequenta a maior unidade de saúde da capital se depara com uma intensa movimentação de camelôs nos arredores do ambulatório, que fica em frente à rua das farmácias. Livres da fiscalização, os ambulantes têm transformado o espaço em uma verdadeira feira clandestina.
Escorados nas grades, os comerciantes exibem toda sorte de produtos. Há quem use a cerca como cabideiro para expor as mercadorias. Alguns se arriscam a preparar espetinhos e a servir pratos de comida a poucos metros da porta do ambulatório, ignorando a possibilidade de contaminação.
A prática descumpre o Decreto nº 39.769, de 11 de abril de 2019, que determina ao ambulante guardar uma distância de 100 metros de unidades hospitalares. De autoria do Governo do Distrito Federal (GDF), o texto regulamenta a atividade de comércio ou prestação de “serviços ambulantes” em vias, ônibus, metrô, estacionamentos e espaços públicos da capital.
Outro lado
Procurada pelo Metrópoles, a Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal) informou que a edição da Ordem de Serviço nº 135/2019 – RA I, publicada no DODF nessa segunda, não altera as regras anteriores, dispostas na Lei nº 6190/18 e no Decreto nº 39.769/19 – ambas continuam inalteradas.
“A Ordem de Serviço só definiu os locais passíveis de autorização precária para o comércio ambulante. A OS também definiu que as regras de restrição não são aplicáveis aos eventos especiais ora autorizados pela Secretaria das Cidades”, destacou a DF Legal, em nota encaminhada à reportagem.
No texto, também é explicada como ocorre a atuação de fiscais. “No tocante à fiscalização, desde a regulamentação da Lei nº 6190/18, o DF Legal tem colocado em prática um cronograma para coibir ambulantes irregulares em todo o DF, em três fases: i) educativa e orientativa, com a entrega de cartilhas com orientações de como obter autorização junto às regionais ii) orientativa e repressiva, com ordens aos ambulantes ilegais para retirada de equipamentos e estruturas; iii) repressiva, com apreensão de equipamentos, mercadorias e estruturas daqueles que continuem irregularmente nos locais fiscalizados”, esclarece o órgão.
Em caso de atuação sem a devida Licença de Funcionamento, a secretaria pode lavrar autos de infrações contra os ambulantes no valor de R$ 1.755,01, caso eles tenham CNPJ, e R$ 3.510,03 (se for CPF), além de apreender as mercadorias. Essas sanções estão previstas na Lei nº 5547/15. “As autuações continuam ocorrendo da mesma forma, porém a secretaria tem um perfil mais orientativo”, acrescenta a DF Legal.
Informações do Portal Metrópoles