Computadores de bordo para consultar antecedentes criminais, câmeras e outros equipamentos de ponta adquiridos pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) para o combate à violência estão inutilizados ou nem sequer passaram da fase de teste. Anunciados no governo de Agnelo Queiroz (PT), a partir de 2012, como ferramentas modernas para aprimorar o policiamento com inteligência, especialmente em função da Copa de 2014, agentes de segurança usaram esses produtos tecnológicos por muito pouco tempo.
Só os chamados terminais remotos embarcados (TRE) — equipado com internet, sistema de georreferenciamento e identificador de impressão digital portátil — custaram R$ 7 milhões. Os 300 TREs entregues a PMs brasilienses em abril de 2012 permitiriam buscar informações de suspeitos em computadores portáteis, nas viaturas, e reconhecer a identidade de alguém por biometria. O Comando ainda poderia monitorar o deslocamento das equipes em tempo real por meio de GPS. Mas eles nunca foram usados porque as viaturas nunca tiveram conexão à internet e os TREs sequer vieram com o software instalados. Voltaram às caixas no mesmo ano.
Os TREs ficariam em 300 dos 2 mil veículos da PMDF. Mas os carros e as caminhonetes só contaram (e contam) com rádios portáteis que têm GPS. Por meio de nota, a corporação alegou que “os computadores utilizados como TREs e os identificadores de impressão digital estão sendo reconfigurados para que possam ser usados com a tecnologia atualmente existente”. Mas não informou quando retirou os aparelhos dos veículos, por que não fez a reconfiguração antes nem quando serão religados. Tampouco o custo do serviço e se há a garantia de manutenção permanente.
Câmeras desligadas
Em 26 de novembro de 2012, a PMDF recebeu, para teste, 14 pequenas câmeras de vídeo que poderiam ser acopladas aos óculos dos militares para registrar abordagens, perseguições, entre outras ações. O plano não vingou. Também por meio de nota, a Polícia Militar disse que “a possibilidade de emprego de câmeras de vídeo acopladas foi uma tecnologia estudada, porém não foram adquiridas por limitações técnicas das empresas em armazenar as imagens”. No entanto, à, época, a PMDF divulgou a aquisição dos aparelhos como algo certo.
O Correio apurou que câmeras GoPro usadas por militares nas ruas, geralmente acopladas aos óculos, foram compradas pelos próprios policiais. “Compram do próprio bolso para se precaver e se resguardar em abordagens policiais. Não são equipamentos que a gente recebe”, destacou um dos PMs que usa o equipamento.
A PMDF também anunciou, em 30 de outubro de 2012, o Serviço de Monitoramento e Acionamento Policial Imediato (Smapi). Comerciantes de regiões como Guará, Vicente Pires e Riacho Fundo I seriam beneficiados com um canal direto ao batalhão local. Em atitude suspeita, o empresário acionaria o aparelho e o chamado chegaria a uma central de comunicação. O pedido de socorro seria transmitido à viatura mais próxima de onde estaria o suspeito.
A PM instalou o Smapi na revendedora de bebidas de Gustavo da Silva, 33 anos, no Guará II, mas o aparelho só funcionou em fase de teste. Comerciante da região há cinco anos, ele teve o comércio assaltado. Gustavo acredita que se o Smapi estivesse em funcionamento ajudaria a evitar esse e outros crimes. “O comandante do batalhão veio, explicou como funcionava e uma empresa instalou, mas só houve alguns testes. Não chegou a ser implementado de fato. Não fosse só mais uma das mil e uma promessas, poderia ser um projeto bem-sucedido”, avalia.
Dono de uma farmácia no Guará I, Jarbas José de Lima, 57 anos, enfrentou cinco assaltos e um arrombamento. O comerciante se lembra das reuniões na época da instalação do Smapi. “Muita gente se decepcionou. Invisto na segurança privada. Coloquei grade, três câmeras e sistema de alarme. À noite, só atendo com as grades na porta”, ressalta.
De acordo com a PMDF, atualmente, o Smapi é adaptado a aplicativos de celular “para viabilizar a comunicação entre a comunidade e os batalhões ”. Mas a corporação não explicou onde estão os aparelhos instalados em alguns comércios, quantos foram instalados, por que não funcionaram, nem mesmo o custo do projeto.
Especialista em segurança pública e professor da Universidade Católica de Brasília, Nelson Gonçalves diz que a PMDF sofre do mesmo mal de gestão das demais PMs . “São problemas administrativos. Essas tecnologias são bem-vindas para trazer qualidade ao serviço da polícia, mas só quem pode explicar o que está acontecendo é a PM. É um problema geral. Essas promessas geram uma expectativa na comunidade, que acaba frustrada”, pondera.
A Secretaria de Segurança Pública afirmou que compras são “independentes” pois as forças policiais têm autonomia.