A nova geração de videogames começa de vez na semana que vem. O Xbox Series X/S chega às lojas a partir do dia 10 de novembro. Já o concorrente PlayStation 5 chega dois dias depois. Com isso, já podemos decretar o fim da vida útil do PlayStation 4 e do Xbox One. É claro que os dois consoles ainda receberão suporte das fabricantes Sony e Microsoft, respectivamente, mas os olhos do mercado agora se voltam para os seus sucessores.
Antes dessa mudança, decidi relembrar a história desses dois consoles nas próximas duas colunas. Semana que vem, eu falarei do PlayStation 4. Hoje, o destaque é o Xbox One, o console que, quando anunciado, tinha tudo para ser um fracasso. Embora mudanças de última hora tenham permitido o console permanecer vivo e relevante aos olhos do público e da indústria, as alterações não foram suficientes para fazer a Microsoft manter a liderança que detinha com o Xbox 360.
O anúncio do Xbox One em maio de 2013 é um desses acontecimentos que entraram para a história dos jogos eletrônicos. A Microsoft decidiu posicionar a marca Xbox e o seu novo console como mais que um videogame. Era a plataforma na qual o gamer também teria acesso a serviços de streaming como Netflix e ESPN e que poderia ser usada para assistir televisão aberta ou a cabo. Uma estratégia que influenciou até na escolha do nome do console e confundiu muitos consumidores, afinal, esse era o terceiro console da marca. Além disso, Xbox One (ou Xbox “um”, em português) era o apelido pelo qual os fãs identificavam o primeiro Xbox. Depois disso, ele passaria ser conhecido como “Xbox Original”.
Quando o primeiro game foi mostrado na apresentação, exibida ao vivo pela internet, mais de 30 minutos já tinham passado, o que com toda razão irritou e confundiu consumidores que esperavam novidades sobre a nova geração de games. Para completar, foi revelado que o novo videogame exigiria conexão constante à internet, algo que mesmo nos dias de hoje ainda seria motivo de reclamação para muita gente (afinal, nem todo mundo mora em área urbana com acesso à internet por fibra ótica). Além disso, jogos usados simplesmente não funcionariam nele: cada mídia física seria atrelada ao primeiro console em que fosse usada. Com a enxurrada de críticas, essas duas medidas acabariam sendo derrubadas poucos dias após anunciadas, mas já era tarde demais: a maior parte dos jogadores já tinha aberto os olhos (e a carteira) para o PlayStation 4.
Afinal, o maior motivo para a escolha de um videogame sempre foram seus jogos exclusivos. E o Xbox One, lançado em novembro de 2013, tem muito poucos. Únicos jogos relevantes são Forza Motorsport 5 e Halo 5: Guardians. O primeiro ganhou diversas sequências disponíveis também para PC. Já o segundo, embora elogiado, não conquistou a mesma unanimidade de outros jogos da franquia. O principal diferencial do Xbox One em seu lançamento, a câmera Kinect, que detecta o movimento dos jogadores, também seria ignorado pelo mercado e consumidores e, em pouco tempo, a própria Microsoft trataria de “esquecer” dele.
Apesar da falta de exclusivos, quem escolheu o Xbox One foi muito bem servido de jogos de publicadoras parceiras, as third-parties, como dizem em inglês. Praticamente todo grande lançamento desta geração estava disponível no videogame da Microsoft, incluindo arrasa-quarteirões como as séries Assassin´s Creed e Resident Evil. Produções menores, de estúdios independentes, porém, têm favorecido mais o Switch e o PlayStation 4.
A Microsoft precisava correr atrás do prejuízo. Primeiro, tornou o Xbox One retrocompatível, atributo até hoje ausente no PlayStation 4. O videogame se tornava capaz de rodar jogos do Xbox 360 e do Xbox original, ainda que a biblioteca de jogos compatíveis seja limitada e tenha crescido lentamente ao longo do tempo. Depois, a fabricante levou ao seu principal console franquias até então exclusivas da linha PlayStation, como Kingdom Hearts e Yakuza, que se tornariam títulos multiplataformas. Apostou ainda em novos modelos de Xbox One: em 2016, lançou o Xbox One S, uma versão mais leve e compacta do videogame. No ano seguinte, posicionou o Xbox como o videogame mais poderoso do mercado com o Xbox One X, uma versão mais potente do console, à frente até mesmo do PlayStation 4 Pro, produto premium da concorrente.
Mas foi só a partir de junho de 2017, com o Game Pass, que a Microsoft conseguiu o diferencial que precisava, ainda que ele tenha vindo um tanto tarde. Trata-se de um serviço que funciona como uma “Netflix dos games”, em que o usuário paga por uma assinatura e tem acesso a centenas de jogos sem qualquer custo adicional. Isso inclui inclusive grandes lançamentos, disponíveis desde o primeiro dia de chegada às lojas. O serviço se provou um sucesso, com mais de 15 milhões de assinantes, e já é defendido por muitos como um dos principais pontos positivos na linha Xbox.
Nos últimos anos, a Microsoft também tem investido pesado na aquisição de desenvolvedoras de games. Desde 2018, foram para o guarda-chuva da fabricante estúdios como Ninja Theory, Obsidian, inXile, Double Fine e, surpreendentemente, a gigante Bethesda, dona de franquias famosas como Wolfestein, Doom, The Elder Scroos e Fallout. A ideia é montar uma forte linha de exclusivos para a marca Xbox, tática que chegou com atraso para o Xbox One, mas a tempo da nova geração.
Apesar desses últimos acertos, a Microsoft continuou atrás dos concorrentes, e só restou a ela se resignar com a terceira colocação no ranking de vendas de consoles na oitava geração. Segundo o site VGChartz, até 24 de outubro de 2020 foram comercializadas 48,4 milhões de unidades de Xbox One, contra 66,8 milhões de Switch (que só foi lançado mais de três anos depois) e impressionantes 113,7 milhões de PlayStation 4, número que já coloca o videogame da Sony como o segundo mais vendido da história, perdendo apenas para o PlayStation 2.
Ao menos em um ponto a Microsoft tem o que comemorar: o Xbox One chega ao fim de sua vida útil sem sofrer nem um pouco com a pirataria. Até a data de hoje, não é possível executar cópias não-autorizadas de games de Xbox One, um feito raro, senão inédito, no mercado de games. Situação bem diferente do Xbox 360, que foi amplamente afetado. Resultado de uma engenhoso trabalho de segurança por parte da empresa, aliado a um possível desinteresse da comunidade hacker, que teria concentrado esforços nas plataformas mais bem-sucedidas PlayStation 4 e Switch.
Fica a dúvida se a Microsoft terá força para retomar a liderança na próxima geração. Curiosamente, eu e muita gente aposta na força do Xbox Series S, versão mais modesta e mais barata do console que, aliado ao Game Pass, tem potencial para se tornar líder de vendas. Vale lembrar que, atualmente, o primeiro lugar é ocupado pelo Switch e um dia já foi do Wii, videogames que estão longe de serem os mais potentes de suas respectivas gerações. É esperar para ver.