Impactados pela pandemia do novo coronavírus (covid-19), os times que integraram a Série A do Campeonato Brasileiro na última temporada tiveram queda de quase um décimo (9,1%) nas receitas recorrentes entre 2019 e 2020. A conclusão é de um estudo da consultoria financeira BDO, realizado com base em demonstrativos financeiros publicados até o fim de abril.

Segundo o estudo, receitas recorrentes não levam em conta arrecadações consideradas extraordinárias, como a negociação de jogadores ou premiações. Entre 19 dos clubes da última Série A, somente quatro apresentaram variação positiva: os três que subiram da Série B de 2019 (Red Bull Bragantino, Atlético-GO e Coritiba) e receberam mais recursos em direitos de transmissão, e o Atlético-MG pela venda parcial do Shopping Center Diamond Mall, em Belo Horizonte. No caso do Massa Bruta, há ainda o início da gestão da empresa de energéticos Red Bull, em meados de 2019. O balanço do Sport não foi finalizado a tempo de ser incluído na análise.

“Diria que [a pandemia] impactou 80% dos clubes da Série A. É uma preocupação das gestões para 2021, pois temos a percepção que esse aspecto negativo continuará. Os aumentos de receita foram questões pontuais. Se você as desconsidera, diria que 100% dos clubes perderam receita na fonte”, avaliou Carlos Aragaki, analista da BDO, à Agência Brasil.

Conforme Aragaki, a pandemia impactou de maneira mais significativa três formas de receita: bilheteria, patrocínios e programas de sócios-torcedores. “É tudo aquilo que envolve, vamos dizer assim, o público. A bilheteria foi fortemente afetada [pela impossibilidade dos torcedores irem ao estádio]. Clubes como Flamengo, Corinthians e Palmeiras vinham de bilheterias muito fortes, com média [de arrecadação] de R$ 60 milhões/ano. Transformando em números, a bilheteria deles seria praticamente a receita total de Coritiba, Fortaleza, Ceará, Atlético-GO e Goiás”, descreveu o analista.

“Muitos clubes perderam patrocínio. Em alguns casos, pacotes de pay-per-view foram cancelados. Ainda que, por exemplo, na pandemia, o Campeonato Paulista tenha sido retomado após dois meses parado, muita gente cancelou os pacotes e demorou a voltar e alguns sequer voltaram. O torcedor, muitas vezes, quer o [programa de] sócio-torcedor para ir ao jogo e ter privilégio na compra dos ingressos. Ainda não é a massa no Brasil que vira sócio-torcedor para visitar o clube ou trocar a camisa”, completou.

Considerando as receitas totais (ou seja, incluindo venda de atletas e premiações), Santos (40%), Internacional (36%), Fortaleza (34%), Bahia (31%) e Flamengo (30%) foram os cinco clubes com maior variação negativa entre 2019 e 2020. Na outra ponta, Ceará (1%), Grêmio (6%), Goiás (9%) e São Paulo (10%) são os que tiveram menor queda.

Por outro lado, quando se observa somente as receitas recorrentes, o Esmeraldino se torna a equipe mais impactada entre um ano e outro, com redução de 56%, seguido por Athletico-PR, Fortaleza (ambos 42%), Flamengo (31%) e Ceará (29%). Destes cinco, Furacão e Vozão conseguiram fechar 2020 no azul.

“A conta básica é: para fechar no azul, você tem que ter mais receita do que custo. É possível, mesmo não sendo top dez de torcida ou exposição de mídia na Série A, fazer uma gestão proativa e razoável. Por outro lado, há clubes que fecharam o ano com déficit. A saída para estes é: se não consigo aumentar a receita, terei que trabalhar para, pelo menos, reduzir custos e dívidas, porque se você tem um passivo menor, tem menos variação monetária para pagar”, sublinhou Aragaki.

Para o analista da BDO, as receitas perdidas podem ser recuperadas em médio prazo, com o advento das vacinas e o retorno do público aos estádios – o que ele projeta apenas 2022 no Brasil. Ele, contudo, alerta para o peso que a venda de jogadores ainda tem no orçamento dos clubes. De 14% em 2016, essas negociações passaram a representar 29% da fonte de receita média das equipes da Série A. Quase um terço, portanto.

“A Europa freou as negociações não em quantidade, mas em valores pagos. Não se conseguirá ter o mesmo ganho em negociações, acredito fortemente nisso, que se tinha no passado. Pode ser que o Brasil continue exportando muito, mas não nos valores de antes. [A receita de transferências] Será ainda uma significativa, mas isso vai pesar. Os grandes investidores [do futebol] no momento são mecenas, chineses ou árabes. Eles também sentiram impacto nos negócios [com a pandemia], não só no futebol. Pode ser que demore alguns anos para voltar aos valores usuais”, concluiu.