A violência, particularmente no que diz respeito aos homicídios, é percebida pela maioria das pessoas como “caprichosa” e “imprevisível”. Para grande parte, inclusive policiais, seria uma “fatalidade”, não um fenômeno social e psicologicamente determinado, cognoscível e controlável.
Essa concepção gera um sentimento de impotência, de estar lidando com algo fora do controle humano, que não se pode impedir ou evitar. É uma visão perigosa, que pode conduzir ao imobilismo fatalista. Durante muito tempo acreditei nesta ideia de que o homicídio é um crime “impossível” de ser evitado. Aprendi que os homicidas seriam imprevisíveis ou pessoas que se tornaram imprevisíveis. A lei e a jurisprudência não escaparam dessa visão, diferenciando entre crimes passionais e premeditados.
Após minha experiência na Secretaria de Segurança Pública do DF tenho percebido que as mortes violentas, incluindo os homicídios, são previsíveis no seu conjunto. Em um bairro, cidade, município, estado ou país, o número de homicídios em um ano, em geral, se assemelha ao número de homicídios do ano anterior. Os países mais violentos em um ano sãos os mesmos dos anos anteriores. As áreas mais violentas são quase sempre as mesmas, ano após ano. No DF os homicídios concentram-se basicamente em cinco regiões administrativas.
Os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI´s) são um fenômeno estável e sua ordem de grandeza pode ser prevista com relativa acuidade a partir dos dados referentes aos anos anteriores, sempre que há estatísticas confiáveis. A estabilidade permite a previsão. É importante ressaltar que “estabilidade” não significa imutabilidade, há mudanças. A estabilidade refere-se também aos aspectos que “compõem” o homicídio, ou seja, as características de quem morre e de quem mata, dias da semana, horários, meses e instrumentos com que se mata. O homicídio também tem dia, local e horário para ocorrer. A polícia precisa focar nestas áreas vulneráveis para reduzir o espaço de atuação do potencial criminoso.
Assim, o homicídio é um fenômeno estável e, no geral, altamente previsível, cujas taxas variam pouco de ano para ano. Como a população também muda gradualmente, salvo em guerras, epidemias, outras catástrofes e grandes migrações, o número absoluto de homicídios num estado ou país muda pouco de ano para ano. Basta ver o gráfico abaixo dos homicídios ocorridos no DF entre o ano de 2000 e de 2014.
É importante ressaltar aqui que um crescimento súbito no número de homicídios sugere fatores novos, como crescimento acelerado do consumo de drogas e da luta por pontos de distribuição, inevitavelmente drogas e homicídios estão intimamente ligados. Outro fator que interfere no aumento súbito de homicídios e merece total atenção é o acesso fácil a novas e potentes armas, além do colapso de fatores dissuasórios, como a polícia e outros mais. Os crescimentos acelerados são raros, mas existem.
Por isso, merecem atenção. O fato de integrantes da PMDF terem deflagrado uma “Operação Tartaruga” no final do ano passado e os números da criminalidade aumentarem logo em seguida sem nenhuma “justificativa” merece ser observado com mais atenção.
Aderivaldo Cardoso – Especialista em Segurança Pública e Cidadania, autor do Livro: Policiamento Inteligente – Uma análise dos Postos Comunitários no DF e Coordenador do Movimento Policiamento Inteligente no DF, que tem por objetivo a busca da eficiência, eficácia e efetividade das ações policiais.