A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado deve votar, nesta terça-feira (3/12), o Projeto de Lei (PL) 1645/2019, que reestrutura as carreiras e reforma o sistema previdenciário dos militares. A sessão, extraordinária, acontece em meio a um clima de insatisfação entre os chamados praças — soldados, cabos, sargentos e suboficiais — com o presidente Jair Bolsonaro.
Ao Correio, militares desse grupo reclamaram de que, no projeto, eles recebem tratamento desigual em relação aos oficiais. Os praças representam 82% dos 770 mil membros das três Forças Armadas. Vários deles estarão na sessão da CRE para pressionar os senadores a corrigirem o que consideram “distorções” do projeto.
Para isso, contam com o apoio de parlamentares de partidos de centro, como o PSDB, e de esquerda, como o PT. “Nosso sentimento é de decepção com o presidente Bolsonaro, que ajudamos a eleger. Fizemos campanha com o nosso dinheiro para ele e os filhos se elegerem, e agora estamos nos sentindo traídos”, disse um sargento, sob condição de anonimato.
Eleições municipais
Em 29 de outubro, durante votação do PL 1645/2019 na comissão da Câmara, familiares de militares, muitos deles aos prantos, chamaram o presidente Bolsonaro de “traidor”. Ivone Luzardo, presidente da União Nacional das Esposas de Militares das Forças Armadas Brasileiras (UNEMFA), estava presente na ocasião.
“Eu estou na luta por melhores salários para os militares, junto com Bolsonaro, desde 2004. Trabalhei arduamente para elegê-lo presidente, mas não posso me calar diante de tanta injustiça aos graduados em final de carreira, reservistas e pensionistas, que estão sendo bi tributados no projeto”, disse Ivone, referindo-se à parte do projeto que prevê a contribuição de pensionistas.
“É como a perda de um pai, alguém que sempre defendemos e que agora vira as costas para nós. É pior do que traição. Bolsonaro levou uma facada no abdome, mas ele nos deu uma facada nas costas”, protestou Cibele Lima, relações públicas da Associação Brasileira de Miltares Especialistas da Aeronáutica (Abramear).
Ela anunciou que, nas eleições municipais do próximo ano, praças de todo o país não votarão em candidatos aliados do presidente da República. “Juntando nossos familiares, amigos e ex-militares, nós somos mais de 15 milhões de eleitores”, afirmou. “Praça vota em praça”, diz um card distribuído em um grupo de militares no Whatsapp.
Texto sem alterações
O relator do projeto no Senado, Arolde de Oliveira (PSD-RJ), que apresentou seu parecer na quarta-feira da semana passada, não alterou o texto vindo da Câmara dos Deputados. O PL 1645/2019, entre outras mudanças, cria o Adicional de Compensação de Disponibilidade Militar, ao qual os militares farão jus devido à dedicação exclusiva à carreira. Trata-se de um percentual incidente no soldo e que crescerá de acordo com a patente, variando de 5% a 32%.
O projeto também reajusta o Adicional de Habilitação, a ser incorporado ao soldo, com percentuais que vão de 12% a 73%, beneficiando os militares que tiverem o maior número de cursos. Segundo representantes dos praças, 78% desse adicional vão para os oficiais, que têm acesso a mais cursos na carreira militar. O Ministério da Economia pretende, com o projeto, alcançar um superávit de R$ 2,29 bilhões aos cofres da União até 2022.
No Senado, os praças contam com o apoio do líder do MDB, Eduardo Braga (AM), do líder do PT, Humberto Costa (PE), e do senador Izalci Lucas (PSDB-DF). Quando o projeto foi analisado em comissão especial da Câmara, eles foram apoiados por vários deputados de esquerda, entre eles Marcelo Freixo (PSOL-RJ) e Gláuber Braga (PSOL-RJ).
O senador Izalci Lucas, membro da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, apresentou duas emendas com o objetivo de corrigir distorções no PL 1645/2019, relativas ao Adicional de Compensação de Disponibilidade Militar e ao Adicional de Habilitação. Em entrevista ao Correio, ele disse que discutiu o assunto na quinta-feira da semana passada com o presidente Bolsonaro e o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos.
“Estamos em negociação”, disse Izalci, que, nesta segunda-feira, voltou a se reunir com o general Ramos e também tem mantido conversações com o secretário especial de Previdência do Ministério da Economia, Rogério Marinho.
Informações do Jornal Correio Braziliense