CEILÂNDIA/ Polo de medalhistas olímpicos: o CEM 9 de Ceilândia

Em Ceilândia, entre os colégios públicos regulares, ficou com o Centro de Ensino Médio (CEM) 9 o posto de mais bem colocado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2018. Entre todas as escolas públicas do Distrito Federal, incluindo as militares e os câmpus do Instituto Federal de Brasília (IFB), o CEM 9 ficou na 18ª colocação. Conseguir resultados desse nível com uma comunidade grande — 1.386 estudantes — e fora do Plano Piloto é um grande feito dos 43 professores e 18 funcionários.

O diretor José Gadelha, no entanto, quer mais. “A nossa escola, de fato, tem um desempenho bom, mas poderia ser melhor se os alunos e as famílias participassem mais. Os pais estão presentes, mas só daqueles 60% que querem algo mais”, afirma. “A gente faz imenso esforço no sentido de mostrar que esses meninos podem galgar curso superior numa universidade pública, e não só na UnB (Universidade de Brasília), há outras federais. E seria bom se os pais incentivassem mais isso também”, analisa.

Os estudantes Vitor Rodrigues, Sara Yasmin, João Victor, Caio Paixão e Thais Maria

Para mostrar que o corpo estudantil pode chegar lá, a equipe pedagógica organiza palestras com ex-alunos que, hoje, estão em universidades federais. “A oferta da educação não termina na matrícula. É preciso que o aluno cumpra um conjunto de exigências para ter resultado”, defende. Entre esses requisitos, o educador cita participar das aulas, dos aulões, dos simulados mensais e dos projetos da unidade. “Os alunos precisam entender que podem e precisam ir além do básico.”

Fundado em 1978, o colégio acumula medalhas e troféus, por exemplo, em olimpíadas do conhecimento. Para o diretor José Gadelha, esse é um dos diferenciais do CEM 9. E os alunos não apenas participam: preparem-se intensivamente. Vários tiveram e aulas extras à noite. Com histórico de estudantes participando de competições nacionais e internacionais, a escola organizou, este ano, a 1ª Olimpíada do Conhecimento do CEM 9.

A competição é multidisciplinar, reunindo provas de ciências humanas, ciências da natureza, matemática, linguagens e códigos. Ou seja, todos os componentes curriculares cobrados no Enem. “Essas olimpíadas não são só disputa. São um jeito de construir conhecimento com solidariedade. Precisamos seduzir a pessoa para a aprendizagem, que é uma busca permanente”, define José Gadelha.

Caio Paixão, Sara Yasmin Gonçalves Rocha e João Victor Alves da Silva são alguns dos alunos que se atraíram pela escola por causa da base em olimpíadas do conhecimento. Tanto que começaram a frequentar o local ainda no ensino fundamental, por influência dos irmãos e pelo interesse em aprender. “Eu queria me tornar um aluno olímpico, e essa é a única escola da Ceilândia que eu sabia que tem esse foco porque meu irmão estudou aqui. Então, vim para cá”, revela Caio, aluno do 3º ano.

Aos 17 anos, ele acumula participações em competições de astronomia, física, biologia, neurociência, matemática e muito mais. Recentemente, participou com equipe de Mostra e Jornada de Foguetes em Barra do Piraí (RJ). “Acho bacana não só o ambiente de olimpíada, nem só o conteúdo em si: gosto da interação com outros alunos olímpicos. E aqui no colégio tem muitos”, explica ele, vestindo uma camiseta de olimpíada de matemática.

Graças a essa interação intensa com a área de exatas e o fato de dar aulas como monitor voluntário a alunos de dependência todos os sábados, Caio decidiu cursar licenciatura em matemática. Um dia, quem sabe, poderá voltar ao CEM 9 como professor. Cursando o 2º ano, João Victor, 17 anos, tem plano parecido: ainda não sabe qual curso fazer, mas tem certeza de que será alguma licenciatura. A inspiração? Os professores do colégio.

“São profissionais e pessoas que eu admiro muito. Eles, além de professores, são amigos dos alunos, fazem a gente ficar mais à vontade para aprender. Eles me influenciam muito a seguir o exemplo deles.” João Victor define o CEM 9 como um ambiente empolgante, muito por causa da preparação para olimpíadas. Ele participou de seleções de matemática, física, robótica, astronáutica e astronomia, além de uma de português.

“Meu irmão mais velho estudou aqui e o mais novo virá no ano que vem. O mais velho me influenciava a participar dos aulões preparatórios para olimpíadas daqui quando eu ainda estava no fundamental. Isso abriu minha mente para projetos”, diz. A trajetória de Sara Yasmin, 16 anos, é similar. “Toda a minha família — inclusive meus pais e meus dois irmãos mais velhos — passou por essa escola. Quando estavam aqui, meus irmãos foram me puxando para participar da preparação para olimpíadas. Então, frequento aqui desde o 6º ano”, relata.

Astronomia e astronáutica, robótica, matemática e física são as áreas em que Sara costuma competir. Graças a esse histórico, a adolescente descobriu a carreira que deseja seguir. “Quero cursar astronomia na USP (Universidade de São Paulo) e me especializar em astrofísica. A USP está adotando processo seletivo pelo histórico olímpico. Então, só pelos resultados em olimpíadas, eu poderia conseguir uma vaga”, observa. Ainda no 2º ano, ela lamenta o dia em que terá de deixar o CEM 9. “Eu gosto muito da escola. Pensar que estou chegando ao fim do ensino médio me entristece”, admite.

Aluno do 3º ano, Vitor Rodrigues, 17 anos, já tem um curso em mente: arquitetura. Ele veio estudar ali pela fama do colégio e pela proximidade com o local onde mora. O carro-chefe do CEM 9, opina ele, é a educação. “Gosto bastante da escola. Em questão de estrutura, ela não é muito forte comparada a outras públicas. Mas em questão de ensino, é bem boa”, afirma. Estão entre as queixas dos alunos o tamanho da escola, pois sentem falta de mais espaço para desenvolver projetos.

Estudantes gostariam de ter um auditório e comentam que, só há pouco tempo, a quadra foi coberta. Na falta de uma estrutura impecável, os estudos ganham destaque. Especialmente no 3º ano, as aulas têm foco em seleções. “Fazemos questões de vestibulares, PAS (Programa de Avaliação Seriada da Universidade de Brasília) e Enem”, comenta Vitor.

O modelo de semestralidade adotado no colégio divide as matérias por blocos. Português e matemática são vistos nos dois semestres. As outras disciplinas passam por um “revezamento”. Se, no primeiro semestre, teve aula de história; no segundo, é a vez de geografia, “Atrapalha um pouco para provas como o Enem, pois vou estar há um tempo sem ver certos conteúdos. Então, os professores nos incentivam muito a estudar em casa.”

Vitor elogia a convivência no colégio. “Sou um aluno gay no ensino médio e nunca sofri nenhum tipo de bullying. Gosto das amizades que formei aqui.” O CEM 9 demonstra estar aberto a todo tipo de pessoa. A equipe aplica inclusão na prática também para alunos com deficiência, tendo uma sala de recursos para ajudá-los, como apontam Iremar Amorim e Graça Evangelista, professores, respectivamente, de matemática e de história.

Savio Ferreira Alves e Lucas Amorim, do 2º ano

Eles explicam que os estudantes não ficam só ali: o espaço é apenas um complemento para auxiliar a assimilação dos conteúdos, às vezes, de modo lúdico, por meio de jogos, por exemplo. “O trabalho deles é muito bom, quando tenho dificuldade em alguma atividade, venho para cá. Eles me ajudam, aconselham, tiram dúvidas”, comenta Lucas Amorim, 18 anos, que está no 2º ano e planeja fazer faculdade de educação física.

À frente da escola desde 2008, o professor de história José Gadelha começou a trabalhar na instituição há 33 anos. Em todo esse tempo, viu o colégio se tornar tradição de Ceilândia. “O CEM 9 é uma escola de gerações. Boa parte dos que estão aqui hoje são filhos dos nossos ex-alunos”, conta. O diretor também acompanhou muitas mudanças de comportamento, nem todas positivas.

“A oferta melhorou. Procuramos oferecer um ambiente saudável para o professor trabalhar e o aluno estudar. Para isso, cobramos respeito às regras”, diz. Só que manter a hierarquia e a autoridade pedagógica em sala de aula se tornou mais difícil. “Os pais foram progressivamente perdendo o papel de pais. Aí o problema vem parar aonde? Na escola. A quebra da hierarquia entre pai e filho termina na escola.”

O diretor lamenta a falta de valores familiares. “A escola ensina. Quem educa é a família. Hoje, a gente perde tempo com o aluno ensinando valores que seriam do ambiente familiar”, aponta. “E essa parte de educar inclui quebrar os egos, mostrar que o mundo não é o seu umbigo, mas o coletivo.” Para tudo isso, José Gadelha defende a importância da disciplina.

“Onde não tem regra, nada pode avançar. E estudar é bunda na cadeira. Por isso, trago o aluno para ficar cinco horas aqui no sábado uma vez por mês para fazer simulado”, diz. Cursando o 3º ano do ensino médio, Thais Maria Silva, 18 anos, valoriza a cobrança das normas no colégio. “É uma escola bem rígida, com horário, com uniforme, tudo é cobrado”, elenca.

“Eu acho importante ter disciplina desde esse período da escola para levar para a vida.” A pressão para estudar, conta Thais, vem dela mesma. Ela está de olho no PAS e no Enem a fim de cursar medicina ou odontologia. “Os professores são bons, se importam com os alunos e com passar bem o conteúdo. O tempo é curto. Então, eles priorizam o que mais cai em seleções”, percebe. A jovem veio estudar ali depois que outros familiares, inclusive o irmão, passaram pelo CEM 9.

Informações do Jornal Correio Braziliense