Contrariando estatísticas. É assim que Sérgio Pereira dos Santos, atual delegado geral da Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE), se sentiu ao assumir o comando da instituição, em março de 2021. Com especialização em Direitos Humanos, Cidadania e Segurança Pública pela Universidade Federal do Ceará (UFC), o gestor reconhece a importância de discutir, enquanto homem negro, ações de combate à intolerância racial.
“Eu faço parte de um perfil que, no Brasil, é muito evidente. Venho de uma família de pessoas negras e pobres, que moravam em uma casa de aluguel, em um bairro da periferia. Nessa visão estigmatizada, de um contexto geral do Brasil, existia a possibilidade enorme que eu não chegasse a uma posição de destaque, justamente por conta da minha cor e por estudar em colégios de bairro. O meu diferencial foi a vontade de ser policial e ajudar as pessoas”, revela o delegado geral.
A entrada nas Forças de Segurança se deu pela Polícia Militar do Ceará (PMCE), forma encontrada para custear despesas da família e seus estudos na faculdade de Direito, mirando no sonho de ser um delegado da Polícia Civil do Ceará. “Eu tinha que conseguir tempo para estudar e conseguir material didático, sendo que grande parte desse material, eu utilizava da biblioteca da universidade. Então, o que eu fazia diante das dificuldades: trabalhava e no meu momento de folga, focava nos estudos até que o cansaço chegasse e eu descansava. Depois, voltava para os estudos e trabalho. Sabia que seria recompensado por isso”, relembra o delegado Sérgio Pereira dos Santos.
Com a luta para chegar ao cargo em que ocupa hoje, o delegado reconhece que as oportunidades são desiguais e busca, com o trabalho, uma sociedade mais justa para pessoas negras. “A gente precisa equilibrar a balança. Precisamos de um tratamento diferenciado para quem está em uma situação de vulnerabilidade, para que ela possa se equilibrar e ser tratado em paridade, equidade, com quem teve mais oportunidades”, comenta o gestor da PC-CE.
A importância da denúncia
Em 28 de outubro de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou os crimes de injúria racial aos crimes de racismo. O entendimento está em discussão também no Legislativo Federal. Para o delegado geral da PC-CE, Sérgio Pereira dos Santos, a medida é mais uma forma de proteção à comunidade negra. “É mais uma proteção a esse grupo historicamente oprimido. Em um país formado pelas mãos de pessoas de diversas nacionalidades, sobretudo de países africanos, não se concebe diferenciar ou traçar algum tipo de perfil de alguém pela cor de sua pele.
Segundo o delegado, equiparar os crimes fortalece, ainda mais, o trabalho da Polícia Civil do Ceará, por meio do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV). “Temos a missão de acolher as vítimas, mas também enfrentar quem traz qualquer tipo de transtorno contra elas. Com esse entendimento, a gente consegue aprimorar, ainda mais, o nosso trabalho e dar uma resposta à sociedade”, diz.
Os casos de racismo e injúria racial podem ser denunciados em qualquer unidade da Polícia Civil do Ceará (PC-CE), inclusive na Delegacia Eletrônica (Deletron), que funciona 24 horas todos os dias. “O fato é que a situação será apurada pelos policiais civis e acompanhada pelo DPGV”, afirma o delegado geral.
Racismo e injúria racial
Injúria racial é um crime baseado na ofensa à dignidade da vítima, com base na cor da vítima, tipificado no Código Penal, com pena de reclusão que varia entre um a três anos. Já o racismo é tipificado pela Lei 7.716/89, conhecida como Lei Caó, que consiste no impedimento da vítima ou de um grupo a acessar espaços ou ocupar cargos, em razão da cor. Com base no entendimento recente do STF, os dois crimes são inafiançáveis e imprescritíveis.