Duas semanas após o envio ao governo federal do reajuste salarial de 37% da Polícia Civil, o governador Ibaneis Rocha (MDB) senta à mesa, nesta terça-feira (12/3), com representantes da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros para discutir um incremento similar aos contracheques das categorias. A conversa ocorre em um momento delicado — na Esplanada dos Ministérios, muitos já veem como inconveniente a negociação da concessão do aumento à Civil em meio ao debate sobre a Reforma da Previdência, permeada pelo discurso de austeridade. Na reunião, que ocorre às 10h, os militares devem apresentar duas propostas ao chefe do Executivo local.
Para ter validade, os projetos seguem um trâmite específico: precisam ser analisados pelo GDF e encaminhados à presidência da República, que os remete ao Congresso Nacional. A primeira proposta das categorias prevê o pagamento do reajuste no mesmo percentual, em seis parcelas, entre este ano e 2021, a exemplo do que ofereceu Ibaneis à Polícia Civil. No mesmo acerto, policiais e bombeiros pedem a incorporação dos valores recebidos a título de auxílio-moradia — que chegam a R$ 3,6 mil — aos salários, a fim de regularizá-los.
Concedido na gestão Agnelo Queiroz (PT), o auxílio é questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). No entendimento da Corte, os repasses até poderiam ser “estabelecidos pelo ente distrital, contudo, o recurso para pagamento deveria ser oriundo do próprio Tesouro, sendo ilegal o custeio pelo Fundo Constitucional do DF” — o caixa é abastecido pela União e, por isso, o Buriti não pode submetê-lo a novos dispêndios sem o aval do Congresso.
Nesta terça-feira, o auxílio trata-se de verba indenizatória e, portanto, não há incidência de impostos. Quando for incorporado ao soldo, porém, a condição mudará. Por isso, as categorias pedem também o aumento do valor do benefício em 27,5%. “Esse é o percentual que perderíamos com a tributação. Ao mesmo tempo, não serão criadas novas despesas para Fundo, que o reaverá no momento de recolhimento do imposto. Ninguém perde”, argumentou o presidente da Associação dos Oficiais do Corpo de Bombeiros, coronel Eugênio César Nogueira. Conforme o acordo, seria acrescido ao soldo, ainda, parte do auxílio-alimentação, de R$ 850.
A segunda proposta das entidades indica a possibilidade de manutenção do auxílio-moradia como verba indenizatória, desde que haja a correta regulamentação do pagamento pelo Fundo Constitucional. Nesse caso, não seria necessário o aumento do valor do benefício e haveria o fim da distinção dos recursos repassados a militares com e sem dependentes, questão que levanta questionamentos administrativos e judiciais (veja Quadro).
Policiais militares e bombeiros reivindicam o reajuste desde o início das discussões na capital em relação à equiparação salarial da Polícia Civil com a Federal. Na visão das entidades representativas, trata-se de uma questão de “justiça”. “Não receberemos nada diferente do que vai ser concedido aos policiais civis. Entendemos que não há hierarquia entre as forças de segurança do DF e, portanto, deve haver simetria no pagamento de salários”, defendeu Coronel Mauro Manuel Brambilla, presidente do Fórum das Associações Representativas dos Policiais e Bombeiros Militares do DF.
Impasse
A proposta de Ibaneis para a Polícia Civil, anunciada no último mês, estabelece o pagamento do reajuste em seis parcelas — prevê-se a quitação de duas por ano. Seriam 10% em 2019; 13% em 2020; e os 14% restantes em 2021. Com a paridade, um delegado no último nível da carreira passará a ter um salário de aproximadamente R$ 30 mil, por exemplo.
O texto, entregue há duas semanas ao ministro da Economia, Paulo Guedes, entretanto, sequer chegou à Secretaria Especial de Desburocratização, primeiro passo para ser analisado. Do ponto de vista de integrantes do alto escalão do governo federal, a matéria pode ser mal interpretada no momento em que o governo prega austeridade para emplacar a reforma da Previdência. Para ganhar tempo, o Planalto afirmou que vai enviar o projeto ao Congresso depois da votação da Previdência e do parecer de Guedes. As informações são da coluna Muito Além da política, publicada na Revista do Correio de domingo.Apesar da instabilidade, o governador Ibaneis Rocha mantém o discurso otimista.
“Na entrega do projeto, o ministro foi muito receptivo. Naquela oportunidade, expliquei que a Polícia Civil, por exemplo, é uma categoria que está há anos sem recomposição salarial”, disse ao Correio.
As categorias engrossam o coro.
“Sabemos que a prioridade do Planalto é a Previdência. Desde que seja um tratamento igualitário, não haverá impasse, caso o trâmite passe deste semestre”, explicou o presidente da Associação dos Oficiais dos Policiais Militares do DF, tenente-coronel Jorge Eduardo Naime, referindo-se ao reajuste que pode ser concedido à Polícia Civil.
Para que seja incorporado aos contracheques dos funcionários da segurança, os reajustes precisam ser chancelados pelo Congresso Nacional. Mas a articulação pode falhar, uma vez que, mais de um mês após a posse, ainda não está definida a liderança da bancada do DF, formada por deputados e senadores eleitos pela capital.
TCDF pede esclarecimentos
O Tribunal de Contas do DF determinou, na última quinta-feira, que a Secretaria de Segurança Pública preste esclarecimentos sobre o pagamento de Gratificação de Serviço Voluntário (GSV) a policiais militares e bombeiros, e a policiais civis. A pasta tem 15 dias para responder. Em dois relatórios, o Ministério Público de Contas questiona o Decreto nº 39.627/2019 e a Lei nº 6.261/19, que tratam do pagamento. A preocupação gira em torno dos altos custos para os cofres públicos: R$ 168 milhões por ano em pagamentos a Policiais Militares e Bombeiros, e R$ 10,5 milhões, a Policiais Civis.
Memória
Regime jurídico
O ex-presidente Michel Temer (MDB) encaminhou ao Congresso Nacional, em julho de 2016, a proposta que previa o reajuste de 37% da Polícia Federal em três parcelas — a sanção ocorreu em dezembro daquele ano. Logo após o anúncio da medida, a Polícia Civil do DF iniciou as movimentações na capital para conquistar o mesmo incremento nos contracheques, uma vez que as corporações funcionam sob o mesmo regime jurídico, a Lei Federal nº 4.878 de 1965, e detêm uma paridade salarial histórica. Sob a justificativa de dificuldades financeiras, o então governador Rodrigo Rollemberg (PSB) disse não ter como realizar o pagamento nos mesmos moldes e, ao longo de um ano, fez propostas distintas. Todas foram rejeitadas pela categoria.
Valores
Veja quanto os militares recebem em auxílio-moradia de acordo com o cargo ocupado
» Coronel: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 3,6 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 1,2 mil
» Tenente-Coronel: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 3,4 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 1,1 mil
» Major: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 3,2 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 1 mil.
» Capitão: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 2,6 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 871»
1º Tenente Auxílio-moradia com dependentes: R$ 2,2 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 761
» 2º Tenente: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 2,1 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 717
» Aspirante oficial: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,8 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 604
» Aluno 3º ano: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 342»
Aluno 1º/2º ano Auxílio-moradia com dependentes: R$ 850 Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 283
» Subtenente: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,9 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 647
» 1º Sargento: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,7 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 587
» 2º Sargento: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,5 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 505»
3º Sargento Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,3 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 466
» Cabo: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1,1 milAuxílio-moradia sem dependentes: R$ 385
» Soldado: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 1 mil Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 365
» Soldado 2ª Classe: Auxílio-moradia com dependentes: R$ 850Auxílio-moradia sem dependentes: R$ 283
Informações do Jornal Correio Braziliense