O título do Flamengo, em 2019, com o português Jorge Jesus, proporcionou uma onda de contratações de técnicos estrangeiros para 2020. Por aqui já estava, também, o argentino Jorge Sampaoli, vice ano passado com o Santos, que aliás começou o ano desempregado. Mas chegaram os portugueses Jesualdo Ferreira e Augusto Inácio, ao Santos e ao Avaí, respectivamente; o argentino Eduardo Coudet, ao Internacional; e o venezuelano Rafael Dudamel, ao Atlético-MG, depois substituído por Sampaoli.
Ao longo do campeonato ainda vieram o catalão Domènec Torrent, para o Flamengo, no lugar de Jesus, os portugueses Abel Ferreira e Ricardo Sá Pinto, para Palmeiras e Vasco, e o argentino Ramón Diaz, para o Botafogo. Chegamos a ter cinco técnicos estrangeiros no campeonato, um recorde. Um movimento que parecia ser de descrédito aos técnicos nacionais, como se não houvesse condições de brigar pelo título com um “prata da casa”.
No momento, a disputa pelo primeiro lugar, com um pouco de boa vontade, está aberta e com oito equipes envolvidas: Atlético-MG, São Paulo, Internacional, Flamengo, Palmeiras, Grêmio, Santos e Fluminense. Desses, apenas dois são dirigidos por estrangeiros, numa mudança considerável do que se projetou no início da temporada, e não por conta da pandemia, mas pela falta de resultados, mal que atinge também os nacionais.
A dúvida é se uma nova vitória de um técnico estrangeiro reforçaria a ideia de que os nacionais estão desatualizados; ou, ao contrário, se a vitória de um técnico brasileiro interromperia essa busca por um treinador de outro país. Acho que nem uma coisa, nem outra. Principalmente porque os dois estrangeiros que brigam pelo título estão em clubes de poder aquisitivo maior que o da maioria dos outros concorrentes. Da mesma forma, se de oito, seis são brasileiros, a possibilidade de um deles ganhar é de 3 para 1.
Mas vamos a uma estatística para aumentar a discussão. Desde 1971, quando o Campeonato Nacional começou a ser disputado (depois a CBF reconheceu títulos anteriores àquele ano), tivemos 49 campeões, com 31 técnicos diferentes. Desses 63% conquistaram o título quando tinham 50 anos ou mais, o que demonstra que experiência conta ponto nessa hora. Vale ressaltar que na faixa etária dos 50-59 anos, foram 53%, ampla maioria.
Dos oito candidatos, quatro têm mais de 50 anos e dois estão na faixa principal: Cuca, do Santos, com 57, e Renato Gaúcho, do Grêmio, com 58; além deles, Sampaoli, do Atlético-MG, com 60; e Abel Braga, do Internacional, com 68. Os outros quatro, com menos de 50, se incluem na mesma faixa etária: Abel Ferreira, do Palmeiras, tem 41 anos; Odair Hellmann, do Fluminense, 43; Fernando Diniz, do São Paulo, 46; e Rogério Ceni, do Flamengo, 47.
Bem difícil de arriscar quem vai levar a melhor, mas curiosamente, se pegarmos os dois primeiros colocados na tabela, pelo aproveitamento, ambos estão fora da faixa 50-59, um acima e outro abaixo dela. Outra curiosidade é que apenas dois já foram campeões: Cuca, em 2016 com o Palmeiras, aos 53 anos, e Abel Braga, em 2012 com o Fluminense, aos 60. Portanto, a possibilidade de termos um novo técnico campeão pela primeira vez é grande.
É interessante observar que não nos faltam técnicos experientes em atividade no Brasil. Temos ainda Luxemburgo, Autuori, Dorival Júnior, Mano Menezes, Marcelo Oliveira, Jorginho, Vágner Mancini. E uma turma chegando: além dos citados, Ramon Menezes, Roger Machado, Tiago Nunes, Lisca, Zé Ricardo. Então, por que importar mão de obra?
Melhor do que eu, essa resposta quem deve dar são os próprios treinadores brasileiros. Da minha parte, os estrangeiros são muito bem vindos pelas experiências que trazem. Há espaço para eles também. Mas se merecem todo o cartaz que ora lhes é oferecido o final do Brasileirão deste ano é que vai responder.
Sergio du Bocage é apresentador do programa No Mundo da Bola, da TV Brasil