O assassinato em massa na Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano, região metropolitana de São Paulo, reacendeu o debate sobre armar a população. As pesquisas científicas sobre o tema, no entanto, mostram que facilitar o acesso às armas pode ter resultados opostos aos previstos por políticos defensores da iniciativa. E mais, estudos nacionais e internacionais, muitas vezes, corroboram o mesmo resultado.
É o caso do trabalho da médica e professora Maria de Fátima Marinho de Souza com um grupo de pesquisadores, publicado na revista Health Affairs em 2007, e de um levantamento elaborado pelo professor Charles Branas, da Universidade de Columbia, em Nova York. Branas publicou seu estudo na revista especializada British Medical Journal um dia antes do massacre perpetrado pelos dois ex-alunos da Raul Brasil. Ele percebeu que a flexibilidade na posse ou no porte de armas aumenta as chances de ataques como o de Suzano.
Por e-mail, o professor afirmou ao Correio que, assim como nos Estados Unidos, o conteúdo das leis de acesso a armas pode ter relação com os tiroteios em massa. “E as leis sobre armas existentes no Brasil já foram relacionadas a uma redução no número de homicídios”, afirma. Embora o trabalho do americano seja mais recente, ele recomenda a leitura do trabalho de Maria de Fátima Marinho.
No levantamento publicado na terça-feira, 12 de março, Branas cria um sistema de pontuação para as legislações dos 50 estados americanos. As notas vão de zero, que significa restrição total de acesso a armas de fogo, a 100, permissão completa para adquirir os equipamentos. Com as notas em mãos, o pesquisador cruzou os dados com episódios de ataques em massa ocorridos nos Estados Unidos entre 1998 e 2015. Ele concluiu que, sempre que uma lei avançava 10 pontos na tabela, havia um aumento de 11% no número de massacres registrados naquele estado.
Ao lado do colega Sonali Rajan, Branas também publicou um estudo sobre a eficiência de professores portando armas protegerem os estudantes em caso de um crime como o de Suzano. Ele concluiu que tal hipótese carece de evidências. A afirmação foi feita no Brasil pelos senadores Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e Major Olímpio (PSL-SP), e nos Estados Unidos, pelo presidente Donald Trump após o tiroteio em uma escola da Flórida que deixou 17 mortos, em fevereiro do ano passado.
O estudo, intitulado Armando professores: o que sabemos? Para onde vamos a partir daqui?, mostra que, mesmo que os professores recebam treinamento para usar armas de fogo de forma adequada, “não existem diretrizes baseadas em evidências para nos ajudar a desenvolver o treinamento necessário aos professores nem para o treinamento continuado para mantê-los preparados para quando a crise atacar.
Para a dupla, ainda não existem meios “para identificar professores dispostos a assumirem uma responsabilidade tão significativa, ou informações para dizer se professores civis armados reduziriam ou aumentariam os riscos para si mesmos e seus alunos quando agentes da lei uniformizados entrarem em ação durante uma crise”.
Brasil
O trabalho de Maria de Fátima Marinho fornece evidências de que as medidas de controle de armas no Brasil ajudaram a reduzir o número de vítimas de tiros. O levantamento leva em conta o número de mortos e a quantidade de internações antes e depois da legislação antiarmas aprovada no fim de 2003 e ada campanha de desarmamento que ocorreu em nível nacional no ano seguinte.
A médica concluiu que, com a adoção do Estatuto do Desarmamento, em 2003, mais de 5 mil mortes por armas de fogo podem ter sido evitadas no Brasil no ano seguinte. Em 2004, pela primeira vez em mais de uma década, a mortalidade relacionada a armas declinou 8% em comparação ao ano anterior.
11%
Crescimento do número de massacres, em estados norte-americanos, cada vez que uma lei estadual avança 10 pontos numa escala que avalia o grau de flexibilização das restrições de acesso a armamentos
Informações do Jornal Correio Braziliense