Salvador (BA) – O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Velloso lamentou a decisão tomada pela Corte nesta quinta-feira (7/11) de proibir o encarceramento de réus após condenação em segunda instância. Por 6 votos a 5, o tribunal alterou o entendimento que era mantido até então, de que a prisão poderia ocorrer antes do fim do processo.
O voto que definiu a mudança partiu do atual presidente do STF, Dias Toffoli. Para Velloso, que presidiu a Corte de 1999 a 2001, o ministro estava “diante de duas interpretações pelo menos razoáveis”. Contudo, ele acredita que a decisão não foi acertada e que “o pano de fundo desse teatro do absurdo é a presunção de inocência interpretada isoladamente e de forma absoluta”.
“Eu optaria por aquela interpretação que melhor serve aos interesses nacionais e aos interesses de combate à corrupção. Essa corrupção endêmica, esse conúbio adúltero entre poder econômico corrompido e poder político corrompido. Então, eu ficaria com aquela interpretação que justificasse e tornasse melhor o combate a essa corrupção, que é a prisão após o segundo grau, como ocorre nos países de primeiro mundo, na maioria dos países civilizados”, afirmou o ex-ministro do STF.
A fala de Velloso foi durante o 4º Congresso Nacional dos Advogados Públicos Federais (Conafe), em Salvador. Ele disse que o resultado representa “um retrocesso”, pois fortalece a sensação de impunidade e abre precedentes para uma atuação mais forte de grupos criminosos. “A grande função política do STF é de realmente pensar nas consequências que (as suas decisões) trazem para a nacionalidade. A vítima, sociedade, também deve ser protegida”, disse.
O ex-presidente do STF citou casos de crimes contra a vida para defender a prisão após condenação em segunda instância. “A vítima deve ser protegida. Quando se trata de crimes contra a vida, é uma lástima. Há 16 anos, os responsáveis pela chacina de Unaí (MG) estão em liberdade, apesar de condenados em 2º grau”, comentou, referindo-se ao crime ocorrido em janeiro de 2004, quando três auditores-fiscais do Ministério do Trabalho — Nélson José da Silva, João Batista Soares Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves — foram assassinados em uma emboscada.
“Donos do poder econômico local foram assassinar fiscais do Ministério do Trabalho em pleno exercício dos seus cargos, porque fiscalizavam aquilo que na realidade era: trabalho escravo. (Os assassinos) estão em liberdade, aguardando o trânsito em julgado que, quando virá? As famílias das vítimas clamam por justiça e os assassinos aguardam em liberdade interpondo recursos e mais recursos, buscando na lentidão processual a nossa maior mazela: a prescrição da ação penal”, acrescentou Velloso.
Além disso, ele fez menção à Operação Lava-Jato como outro fator para justificar a constitucionalidade da prisão antes do fim do processo, e até parabenizou a “coragem” do hoje ministro da Justiça e Segurança Pública e ex-juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Moro.
“Nós tivemos um combate eficaz com aquilo que se denominou a Operação Lava-Jato, que prestou ao Brasil um grande serviço. Prestou, sim, graças à coragem daqueles moços e à coragem do juiz (Sergio Moro). Não fora a coragem, nós não teríamos sucesso em combater o conúbio adúltero entre poder econômico corrompido e poder político corrompido, ambos corruptores. Pela primeira vez nós vimos que os mais importantes representantes do poder público presos confessando delações e construiu-se um edifício probatório com base em tudo isso”, frisou o ex-ministro.
Ele ainda acrescentou: “quanto de dinheiro que se desvia de obras públicas poderiam ser usados para construir escolas? Quantos que deixariam de morrer nos corredores dos hospitais à procura de tratamento para a saúde se aqueles bilhões de reais não tivessem sido desviados?”.
De qualquer forma, Velloso prevê que o assunto deve voltar a entrar em pauta futuramente. “É uma decisão do Supremo e ela tem de ser cumprida e respeitada. Mas eu acho que não termina aqui, porque os danos à segurança pública serão tais que, muito em breve, o Supremo retornará ao tema”, analisou.
Informações do Jornal Correio Braziliense