Ouvi em uma rádio enquanto me dirigia ao trabalho em uma manhã que o Governo do Distrito Federal irá inverter a faixa exclusiva da EPTG nos horários de pico e fiquei pensando sobre o assunto desde então. Será que todos os riscos foram avaliados? O benefício dessa inversão vale o risco? O Governo está preparado para situações de emergências?
Todos os dias pela manhã sigo pela EPTG para o plano piloto e a noite faço o trajeto contrário de retorno para a minha residência em Águas Claras e o tempo que levo preso no engarrafamento que praticamente vai em todo o trajeto fico observando os pontos de gargalo e a aquela faixa exclusiva favorecendo poucas pessoas, algumas até que de forma esperta logo procuram uma forma para conseguir trafegar ali.
A EPTG é mais um exemplo de falta de planejamento e o resultado não chega nem próximo ao esperado, as saídas e entradas das marginais ficam no mesmo lugar criando engarrafamentos na faixa da direita e que reflete nas faixas do meio e esquerda devido aos motoristas que tentam fugir da faixa de última hora e outros que procuram a faixa da esquerda para furar a fila forçando a entrada de última hora, mas para isso, praticamente parando no meio da rodovia.
Então vemos a faixa exclusiva, pouco trafegada por ônibus, taxis, ambulâncias e viaturas militares, além de poucos motoristas que se arriscam em trafegar ali na certeza da impunidade, já que ao perceberem viaturas atrás basta entrar em alguma das paradas vazias e inutilizadas dando passagem e retornando em seguida sem nenhum importuno.
Vamos pensar um pouco sobre como tudo começou e a efetividade dessa faixa. Um belo dia o Governo do Distrito Federal concluiu que criar uma faixa exclusiva faria com que as pessoas que andam de ônibus ficassem menos tempo no trânsito, assim consequentemente, mais pessoas se interessariam em andar de ônibus e menos carros teríamos nas ruas em horário de pico, mas porque não aproveitarmos essa ideia e colocarmos paradas em alguns pontos fazendo com que mais pessoas sejam atendidas? Assim aumenta-se a justificativa dessa ideia que custaria alguns milhões aos cofres públicos do DF.
Bom, já que temos poucos ônibus trafegando por ali porque não liberamos também para os taxis, viaturas da Policia Militar, Civil, Bombeiros e Ambulâncias? Dessa forma diminuímos o tempo para os atendimentos à população, pelo menos quando for necessário a esses veículos trafegarem por ali. Ótimas ideias, mas como sempre com pouco ou nenhum planejamento somado à falta de esclarecimento e fiscalização. A faixa exclusiva virou corredor de favorecimento àqueles que conseguem justificar o tráfego chegando em casa antes dos demais, bem como reduto de arrecadação financeira no fim de ano.
Já que o Governo não conseguiu sincronizar o término da obra com a compra de ônibus com portas do lado esquerdo, uma vez que nunca existiu em Brasília esse tipo de ônibus, e considerando o tempo que vem se arrastando a discussão sobre o que fazer com a faixa exclusiva da EPTG, o novo Governo lançou outra brilhante ideia. Por que não inverter o tráfego dos ônibus no horário de pico? Assim, podemos utilizar os ônibus que existem nas frotas do DF com as portas do lado direito e damos um uso a esse problema criado pelo próprio governo.
Quem passa pela EPTG, principalmente nos horários de pico já percebeu que a faixa exclusiva é utilizada por alguns motoristas como parada quando o carro quebra, que quando um ônibus quebra o transtorno para quem trafega na faixa da esquerda aumenta e que em alguns lugares os motoristas dos carros são obrigados a entrarem na faixa exclusiva para entrarem ou saírem da rodovia, então o que pode acontecer?
Posso citar algumas situações e levantar alguns questionamentos sobre essa inversão:
Um ônibus está trafegando na faixa e o ônibus quebra, qual é o impacto que isso pode acarretar no trânsito? Hoje os outros ônibus seguindo o fluxo da rodovia apenas ligam a seta e desviam do veículo parado, mas na contramão como seria isso? Já pensou em ser surpreendido com um ônibus surgindo atrás de outro bem na sua frente? O motorista do ônibus irá fazer o trabalho das autoridades de trânsito para isolar o espaço suficiente para os outros veículos manobrarem, espaço esse que deverá ser pelo menos o dobro do espaço ocupado pelo veículo parado, ou o teria o GDF guinchos preparados para tirar o veículo quebrado imediatamente diminuindo o impacto no trânsito?
Um carro ou uma moto está seguindo o trânsito quando de repente é surpreendido com os carros da frente parando ou o seu veículo é atingido na lateral jogando-o para a faixa exclusiva, vindo o veículo pesado na contramão terá tempo e distância suficientes para evitar um desastre? Os motoristas que vem na contramão impossibilitados de evitarem o impacto manteriam a calma e não teriam o reflexo de jogarem seus veículos para um lado ou outro?
Nos lugares onde é preciso entrar na faixa exclusiva para sair da EPTG e devido a engarrafamentos for necessário parar o veículo, como no viaduto que liga ao SIA, o motorista do ônibus que vem na contramão conseguiria ver a situação em tempo suficiente para evitar a colisão? O ônibus que conseguir parar teria que esperar todo o trânsito contrário esvaziar até conseguir passar? Ou essas conversões serão impedidas piorando ainda mais os pontos de gargalos?
Os passageiros que descerem nas paradas de ônibus distantes das passarelas atravessarão a EPTG como? Com o trânsito lento será que conseguiriam atravessar entre os carros com as motos passando pelo corredor? Nos lugares em que tem passarela, que não tem nenhuma iluminação, teriam coragem de atravessá-las? As pessoas teriam coragem de esperar nas paradas pouco iluminadas? Passageiros que se aventurarem em cruzar a EPTG para encurtarem o caminho até o destino lembrarão que é necessário olhar inicialmente para um lado e depois para o outro a fim de não serem atingidos pelos veículos?
A noite os faróis dos veículos que vem na contramão não ofuscarão a visão dos motoristas da faixa da esquerda tornando o tráfego na EPTG ainda mais lento do que temos hoje?
Desde o dia que soube da inversão da faixa exclusiva da EPTG fico me perguntando se o GDF realmente avaliou todos esses e outros pontos que abordei aqui pensando na saúde da população, se foi realmente calculado se a parcela da população atendida valerá todo o risco com essa inversão.
Hoje, antes mesmo do início da inversão já é possível ver cones colocados para isolar a faixa amassados. Espero que essa decisão não seja mais uma daquelas ideias brilhantes para justificar custos, mas que na verdade não tenha sido tomada sem o devido planejamento e análise dos impactos e riscos, afinal chega de decisões erradas, mesmo que seja na boa intenção de acertar.
Texto de Renato Godoi, Coordenador de Projetos, Morador de Águas Claras, enviado ao Blog Policiamento Inteligente.