Código de Processo Penal
Decreto nº 3.689, de 03 de outubro de 1941
Ao iniciar o estudo sobre o Código de Processo Penal no Brasil é interessante observar suas motivações. A exposição de motivos retrata bem o “espírito” imperante à época. Percebe-se nas palavras do Dr. Francisco Campos[1] o desejo de inovação, in verbis:
As nulidades processuais, reduzidas no mínimo, deixam de ser o que têm sido até agora, isto é, um meandro técnico por onde se escoa a subsistência do processo e se perdem o tempo e a gravidade da justiça. É coibido o êxito das fraudes, subterfúgios e alicantinas. É ampliada a noção do flagrante delito, para o efeito da prisão provisória. A decretação da prisão preventiva, que, em certos casos, deixa de ser uma faculdade, para ser um dever imposto pelo juiz, adquire a suficiente elasticidade para tornar-se medida plenamente assecuratória da efetivação da justiça penal. Tratando-se de crime inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, desde que o preso seja imediatamente apresentado ao juiz que fez expedir o mandado. É revogado o formalismo complexo da extradição interestadual de criminosos. O prazo da formação da culpa é ampliado, para evitar o atropelo dos processos ou a intercorrente e prejudicial solução de continuidade da detenção provisória dos réus. Não é consagrada a irrestrita proibição do julgamento ultra petitum. Todo um capítulo é dedicado às medidas preventivas assecuratórias da reparação do dano ex delicto. (O grifo é nosso)
Mais uma vez, ressaltando o “espírito” da época, percebe-se uma tentativa de desburocratização do sistema processual. Uma busca pela garantia de fortalecimento e prestígio a atividade do Estado na sua função repressiva e ao mesmo tempo uma busca para garantir e assegurar, com mais eficiência do que a legislação à época, a defesa dos acusados. Nessa estruturação do processo conservou-se o inquérito policial, ele foi mantido, “como processo preliminar ou preparatório da ação penal, guardadas as suas características” temporais.
A manutenção do inquérito policial é justificada pelas dimensões continentais de nosso país. Uma federação com viés conservador que resiste a mudanças até os dias de hoje. Para o Dr. Francisco Campos “o ponderado exame da realidade brasileira, que não é apenas a dos centros urbanos, senão também a dos remotos distritos das comarcas do interior, desaconselha o repúdio do sistema vigente”. Cabe-nos analisar de forma extensiva que para o pensamento em outrora, acabar com o inquérito policial, criando o juízo de instrução (atuais Tribunais de Justiça) importaria em “limitar a função da autoridade policial a prender criminosos, averiguar a materialidade dos crimes e indicar testemunhas”, e que isso “só é praticável sob a condição de que as distâncias dentro do seu território de jurisdição sejam fácil e rapidamente superáveis”.
Quando se avança sobre as vantagens do inquérito policial, nota-se a argumentação de que há em seu favor, “como instrução provisória antecedendo a propositura da ação penal, um argumento dificilmente contestável: é ele uma garantia contra apressados e errôneos juízos, formados quando ainda persiste a trepidação moral causada pelo crime ou antes que seja possível uma exata visão de conjunto dos fatos, nas suas circunstâncias objetivas e subjetivas”. Sob a égide dessa luz é possível concordar que ele figura como “um balde de água fria” no calor da discussão. Não podemos deixar de posicionar sobre as divergências que podem ocorrer durante a condução das investigações, por mais audaz e perspicaz que seja a autoridade policial dirigente do inquérito policial, quando ainda perdura o “alarma provocado pelo crime”. Não há dúvida de que o responsável pela condução dos trabalhos está sujeito a “equívocos ou falsos juízos a priori, ou a sugestões tendenciosas”.
É comum, muitas vezes necessário, rever a linha da investigação, sendo preciso, por vezes, voltar atrás, refazer tudo, para que a investigação se oriente no rumo certo, até então despercebido. Nesse sentido, estamos convictos de que o inquérito policial enquanto norteador da ação penal se perpetuara no estado brasileiro.
Para melhor entendimento do tema sugere-se a análise dos artigos. 1º ao 6º do Código de Processo Penal Militar:
[1] Publicado no Diário Oficial da União de 13 de outubro de 1941.
[2] A referência foi feita à CF/1937. A constituição vigente trata da matéria nos arts.50, §2º, 52, I, parágrafo único, 85, 86, § 1º, II, e 102, I, b.