Hoje descobri que vou para o “tronco”, pois desafiei o meu “senhor” de “escravos”. Um homem poderoso e arrogante que não gosta de ser contrariado. Serei punido com rigor, para nunca mais contrariá-lo. Antigamente não existia uma tal de sindicância, mas agora foi inventada para disfarçar as punições em nossa nova senzala. Punem-se quem eles querem. Escravos rebeldes, sem educação. As chibatadas são diferentes, mas machucam como as de antigamente. Não sei bem o que fiz de errado, mas sei que meu “senhor” ficou muito bravo, ficou muito contrariado. Bem assim ele pensou: “Como pode um “soldado”, “um escravo”, desafiar um “coroné”?” “Como ousa ele pensar, e ainda querer falar!” “Expor seus pensamentos, escrevendo-os em rodapés!” “Dando aulas, publicando livro, botando escravos para pensar!” “Quem ele pensa que é?” “Um homem livre? Um cidadão? Quem ele pensa que é?”

Em nossa polícia tem muita corrupção, desvio de dinheiro, abuso de autoridade e violência contra o cidadão, mas nenhuma sindicância é aberta para apurar tais condutas, é melhor não mexer com tais vilões, mas quando um “coroné” é criticado e se sente magoado logo vem a “reação”: “VAMOS DAR UMA PUNIÇÃO?” Vou para o tronco de pé olhando nos olhos desse “coroné”.

Minha ficha só têm elogios por bons serviços prestados ao longo de mais de doze anos nesta IMENSA senzala. Caso venha essa “punição” para mim será como um elogio por não aceitar tal dominação, que na verdade é uma GRANDE aberração. Não tenho medo do tronco. Fui forjado no caldeirão. O couro é duro de tantas chibatadas, mais uma não fará vermelhidão! Sou negro companheiro, acostumado com a solidão, no tronco eu fui forjado, com o sofrimento dos meus irmãos! Ser polícia está no meu sangue e também no meu coração. Ser militar é outra história e não merece minha atenção! Sou homem livre e de bons costumes e disso não abro mão!