Se fosse um jogo de futebol, poderia ser dito que o jogador reserva, convocado para uma ou algumas partidas no lugar do centroavante matador afastado por algum motivo, talvez uma viagem ao exterior, deu um show e marcou quantos gols foram possíveis. Como não é uma partida de futebol, mas a forma como se exerce o poder, é preciso então mudar o sentido da comparação. O reserva deu um show. Em outras palavras, o general Hamilton Mourão, vice-presidente, venceu a batalha da comunicação no seu primeiro teste à frente do governo. Um feito raro, muito raro, pois essa é uma das guerras mais difíceis de vencer.
Na semana em que substituiu o titular Jair Bolsonaro, de viagem para Davos, na Suíça, Mourão evitou portas laterais ou de fundos para entrar em seu gabinete. Passou sempre entre um pequeno exército de repórteres, acampado na entrada do anexo do Palácio do Planalto onde está instalado o gabinete do vice. Fez charme na entrada e na saída, só para dar tempo a um pequeno suspense, parou e deu entrevistas, sobre tudo e sobre todos. A pergunta é sobre reforma da Previdência? O tempo de serviço dos militares deve ser aumentado de 30 para 35 anos e o projeto não deve ser enviado junto com a peça principal. É sobre as suspeitas que envolvem o senador eleito Flávio Bolsonaro, filho do presidente? Apurar e punir, se for o caso. Há solução para a Venezuela? Maduro e seu bandão deveriam procurar um país que os queira. Segue o baile. E assim a semana se passou. Mais do que responder aos repórteres, Mourão deu seu recado.
Indagado sobre decreto assinado por ele que ampliou o número de pessoas – servidores comissionados também, e quase todos por indicação política –, o que vai comprometer a transparência do governo, Mourão não fugiu. Disse que a assinatura do decreto não foi ideia sua, que o ato foi combinado com o presidente e que o documento foi preparado pelo governo anterior. Simples assim. Como deve ser a comunicação.
Quando questionado sobre o que acha da decisão do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) de abrir mão do mandato de deputado e ir embora do País por causa das ameaças que vem sofrendo, Mourão respondeu que o parlamentar deve ter suas razões, sobre as quais não tinha mais detalhes. Em seguida, fez uma defesa do estado democrático de direito: “Quem ameaça parlamentar está cometendo um crime contra a democracia. Nela você tem sua opinião e liberdade para expressá-la. Parlamentares, eleitos, representam os cidadãos que votaram neles. Quer goste ou não, você ouve. Gostou, bate palma. Não gostou, paciência. É assim”. No meio disso tudo, Mourão ainda postou nas redes sociais um foto dele cercado de jornalistas. No texto, os agradeceu por tê-lo esperado todos os dias.
Goste-se ou não do general Mourão, o resultado foi que as notícias consideradas positivas por empresas especializadas nesse tipo de medição deram uma goleada nas negativas.
Até agora, só o ministro da Economia, Paulo Guedes, vinha conseguindo tal feito.
O ministro da Justiça, Sérgio Moro, um campeão da comunicação durante a Operação Lava Jato, o que fez com que entrasse em sintonia com todo o País e fora dele, ainda está meio lá e meio cá desde que aceitou o convite para ser o superministro encarregado de criar um plano para salvar a arruinada segurança pública do País e criar métodos eficazes de combater o crime organizado e devolver o domínio dos presídios ao Estado. Talvez mais pra lá do que pra cá, pois atrapalhado pelo noticiário que envolve Flávio Bolsonaro, além de assistir, sem nada que fazer, à divulgação, gota a gota, do relatório do Coaf, órgão sob sua jurisdição, a respeito da movimentação bancária de familiares do presidente da República.
Texto do Colunista João Domingos, O Estado de S.Paulo/Estadão