São 20 câmeras instaladas, ligadas e bem presas a árvores. O sensor de movimento e o dispositivo de modo noturno com infravermelho, acionados. Em uma área de 31 mil hectares de Mata Atlântica, um grupo de pesquisadores está em busca de imagens da rara onça-pintada, maior felino do continente americano. Nesse bioma, a onça-pintada está criticamente ameaçada de extinção. Neste domingo (4), Dia Mundial dos Animais, será mais uma jornada de coleta de dados das câmeras. Imagens inéditas no Vale do Ribeira serão reveladas nos próximos dias e mostrarão por onde os bichos estão.
Animais em extinção: conheça espécies ameaçadas por bioma
O projeto desenvolvido pela organização não-governamental Onçafari e pela reserva Legado das Águas, no Vale do Ribeira, no interior de São Paulo, reúne pesquisadores das duas entidades para identificar, monitorar e depois estudar esses raros indivíduos no local.
Toda pista pode ser fundamental para conservação de felinos ameaçados. O retrato do momento preocupa entidades e especialistas pelo desequilíbrio que o desaparecimento de um animal desse porte pode causar.
Segundo o biólogo e pesquisador da Onçafari Leonardo Sartorello uma eventual extinção da onça-pintada, que está no topo da cadeia alimentar, pode trazer consequências imensuráveis para todo o ecossistema. Entre as presas naturais, estão os animais silvestres, como capivaras, jacarés, queixadas, veados e tatus.
“Uma extinção das onças-pintadas geraria populações maiores dessas outras espécies, o que provocaria efeitos desconhecidos também para os seres humanos”, diz o biólogo.
Sartorello contextualiza que o Brasil tem a maior densidade populacional de onças-pintadas do mundo (com uma estimativa de cerca de 50% dos animais de todo o planeta). Incluindo a Mata Atlântica, somam-se mais de 20 mil indivíduos distribuídos por outros biomas brasileiros.
Onças-pintadas precisam de espaço
A onça-pintada (que inclusive está representada na nota de R$ 50) é o maior felino do continente americano e pode chegar a mais de 130 quilos. O biólogo explica que tem por característica ser um animal de tocaia, mas também costuma percorrer longas distâncias.A desconfiguração do habitat é ameaça real para a espécie que precisa de espaço preservado e corredores para sobreviver.
Justamente para garantir a continuidade da espécie, é que o projeto no Vale do Ribeira segue cada rastro desses habitantes das nossas matas.
Fundador da Onçafari, Mario Haberfeld, ressalta que onças-pintadas já foram avistadas naquele trecho da Mata Atlântica. De acordo com os pesquisadores, a população de onças estimada em todo esse bioma é de aproximadamente 220 indivíduos e, por intermédio da tecnologia das câmeras, os especialistas buscarão pistas e rastros dos animais a serem protegidos. “A região [no Vale do Ribeira] é o local ideal para conseguir fazer esse trabalho. É uma área protegida e cuidada”, destaca.
De acordo com David Canassa, diretor da reserva Legado das Águas, o Vale do Ribeira abriga mais de 13% de todas as espécies animais ameaçadas de extinção na Mata Atlântica. “Nós já fizemos um rastreamento de como esses animais andam na Mata Atlântica. Agora será um trabalho de muito mais precisão”.
Uma característica dessa busca científica é que a identificação das onças-pintadas, por exemplo, se dá pelas rosetas (as pintas), que têm papel equivalente ao das impressões digitais nos seres humanos. Haberfeld explica que, após a coleta dos dados, será possível traçar os rastros dos animais, quais espécies estão presentes e, no caso dos felinos, identificar até mesmo em quais árvores sobem ou arranham para marcar território.
“Nenhuma onça é igual à outra. No futuro, podemos colocar colares para poder acompanhar os movimentos e obter vários outros dados”, diz Haberfeld.
Mais para frente, a parceria também prevê a reintrodução de animais recuperados para repovoar o lugar. “Minha expectativa é que se tenha resultados rápidos. O trabalho de educação ambiental já terá início no começo do próximo ano.”, afirma o diretor da reserva Legado das Águas.
Conscientização na prática
O biólogo Leonardo Sartorello aponta dois caminhos no processo de preservação do animal: a conscientização dos grupos que vivem próximos aos habitats dos animais no sentido de evitar a caça e um outro, que começa a ser traçado na reserva paulista: “Além do impacto imensurável que pode significar a extinção de uma espécie, é preciso compreender que o respeito ao meio ambiente e a preservação agrega valor imensurável à região, estímulo extra para preservar”.
Por isso é que, para além da frente científica, o próximo passo do projeto será aproximar as pessoas, inclusive do local. A ideia é promover palestras e passeios sobre as onças e fomentar o ecoturismo de observação na reserva ambiental. A ideia é que os encontros do público com os animais ampliem o conhecimento dos visitantes sobre as espécies. “Chegaremos, no ano que vem, ao público externo com as ações de educação ambiental”, promete Canassa.
Para o fundador do Onçafari, a onça é um atrativo importante para o ecoturismo. “As pessoas querem conhecer os grandes predadores e se estão sendo preservados. É um indicador importante de que essa parte do bioma está inteiramente conservada”.
Sartorello explica que o local tem potencial conservacionista e também de negócios. “Lá, por exemplo, é um dos raros refúgios de animais. Todos esses animais preservados propiciam esse corredor ecológico e o equilíbrio da cadeia alimentar”. David Canassa identifica que um trabalho importante é desmistificar a ideia do medo do animal.
“É fundamental entender que a onça não tem o ser humano como um alvo. É uma espécie que evita contato com animais que não são suas presas prioritárias”, lembra Sartorello.
Já Mario Haberfeld, também reforça que é preciso que as pessoas saibam da importância desses animais na natureza e que se envolvam em seu processo de proteção. “Já pensou um visitante ter conhecimento que um animal como esse passou há pouco tempo por um determinado lugar?”, projeta Haberfeld, fundador da Onçafari.
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